V Domingo da Páscoa - Ano C
Como Eu vos amei, amai-vos também uns aos outros.” Jo 13, 34
As despedidas nunca são fáceis. Pensar que deixamos de ver pessoas, uma terra, realidades que amamos, abre uma fenda dentro de nós. É como se ficasse um pouco do que somos naquele lugar, naqueles corações. E assim me maravilho com os “discursos da despedida de Jesus” que S. João nos dá no seu Evangelho, ao longo de três capítulos. São palavras que têm um sabor de tesouro, do qual vamos retirando sempre coisas novas e antigas, como o presente de um pequeno “manual de instruções” do essencial para a vida e a missão dos seus discípulos. O mandamento novo do “amai-vos uns aos outros” passa a ter uma medida: “como Eu”! Isto é, sem medida, sem limite, tudo e todo!
Confundimos facilmente “amar” com “gostar”. E, contudo, trata-se de algo diferente. Quantas vezes lembro Martin Luther King, o pastor protestante norte-americano, defensor dos direitos cívicos dos negros, que dizia: “Eu não consigo gostar de quem vem a minha casa e maltrata a minha família porque somos negros; não consigo gostar dele, mas, porque sou cristão, quero amá-lo.” A radicalidade que Jesus propõe de “amar os inimigos”, não é expressão dessa ultrapassagem do sentimento? Quando se ama, ultrapassamos o “condomínio afectivo” dos amigos, e arriscamos uma universalidade que parece impossível. Que bom, nesse esticar do coração, estarem os que chamamos amigos, mas que sintonia com o coração de Deus quando vamos mais além!
Como Jesus ama de modo universal, não podia propor-nos um viver “a meio-amor”. É o amor sem muros nem fronteiras de qualquer espécie, numa preferência pelos que são periferia de tantos centros (religiosos, e outros tão “bem colocados”), pelos que não contam e são descartáveis, os discriminados e excluídos, os que erraram ou persistem no mal. E é fácil constatar essa universalidade: como Ele, os que assim vivem, também receberão incompreensão e recusa.
Como Jesus ama de modo concreto, fazendo de cada um o centro da sua atenção, numa contínua saída de si, não podia oferecer-nos uma “auto-salvação” de consolos espirituais. Pensar primeiro no que pode acontecer ao outro, nas mil possibilidades de o ajudar, como fez o bom samaritano no caminho de Jericó, é o sinal dessa saída. “Se eu penso em mim, tu ficas só, / se eu penso em ti seremos nós”, diz um cântico conhecido. Como Jesus, haverá também vozes que nos chamarão: “amigo de publicanos e pecadores”!
Como Jesus ama sem contabilidade nem medida, e não espera retorno, não podia desejar discípulos calculistas e avarentos, de tantas graças que guardam em vez de dá-las gratuitamente. É o amor em abundância da herança desperdiçada, do denário dado a todos, da outra face apresentada, do perdão até “setenta vezes sete”, do céu oferecido ao bom ladrão, do bem que se faz ao que nos fez mal. E como Jesus, as vidas dos que amam assim, incomodando poderes e pondo em causa a ordem pública, encontrarão outras tantas crucifixões.
“Como Ele…” parece impossível, mas “com Ele” já descobrimos esse amor na vida de tantos!
Pe. Vitor Gonçalves
in Voz da Verdade
O tema fundamental da liturgia deste domingo é o do amor: o que identifica os seguidores de Jesus é a capacidade de amar até ao dom total da vida.
- No Evangelho, Jesus despede-Se dos seus discípulos e deixa-lhes em testamento o
“mandamento novo”: “amai-vos uns aos outros, como Eu vos amei”. É nessa entrega radical da vida que se cumpre a vocação cristã e que se dá testemunho no mundo do amor materno e paterno de Deus.
- Na primeira leitura apresenta-se a vida dessas comunidades cristãs chamadas a
viver no amor. No meio das vicissitudes e das crises, são comunidades fraternas, onde os irmãos se ajudam, se fortalecem uns aos outros nas dificuldades, se amam e dão testemunho do amor de Deus. É esse projecto que motiva Paulo e Barnabé e é essa proposta que eles levam, com a generosidade de quem ama, aos confins da Ásia Menor.
- A segunda leitura apresenta-nos a meta final para onde caminhamos: o novo céu e a nova terra, a realização da utopia, o rosto final dessa comunidade de chamados a viver no amor.
Pe. Joaquim Garrido – Pe. Manuel Barbosa – Pe. Ornelas Carvalho