Comemoração de todos os Fiéis Defuntos

01-11-2014 16:43

 

"Quem acredita em Mim, Jo 11, 25

 

Hoje faltam-me as palavras para falar deste dia de fiéis defuntos. Como faltam quando morre alguém, e muito mais, quando é alguém que amamos. Diante da morte o silêncio não é uma derrota, mas uma expectativa e uma companhia. “Não pode ser só isto. A vida abraçada e amada não pode, simplesmente, acabar!; parecem ecoar vozes dentro de nós, com dor, revolta, saudade, e esperança à mistura. Nem com a banalização da morte que as notícias nos trazem de perto e de longe, e as reportagens e ficções que fazem dela relatos da nossa fragilidade, nos habituaremos a esta evidência. Morrer não encaixa com a vida plena que desejamos! E como a desejaríamos se sempre conhecemos que tudo morre, e se transforma, e há um ciclo de vida a que pertencemos?    

É difícil o convívio com a morte. Mesmo os que temos fé e acreditamos na promessa de Jesus, (o Ressuscitado que nos há-de ressuscitar) experimentamos a fragilidade das certezas, a dor da separação, o desejo de abraçar quem amamos e agora já não está aqui. E todo o ambiente que nos rodeia, exaltando a vida, a festa, o excesso, a alienação, procura não falar dela e ignorá-la. Como se não existisse. Vive a clandestinidade que se associa à doença e ao sofrimento, onde há alguns ombros em que é possível chorar sem consolos fáceis, e presenças cheias de amor com poucas palavras. Dizia Gabriel Marcel que “amar alguém é dizer-lhe: ‘tu não morrerás”, e nesses momentos podemos vislumbrar como o amor é mais forte que a morte. Mesmo quando a morte parece vencer.

Não creio que viver seja aprender a morrer. E lembro muitas vezes a frase de Sebastião da Gama: “que a morte, quando vier / não venha matar um morto”, para afirmar a responsabilidade que nos é confiada de viver (em cheio) até ao fim. E se a confiança em Jesus Cristo não retira totalmente o medo, a fragilidade, a tristeza, ela abre-me para o “Deus das surpresas” que desejo encontrar e abraçar. Ainda que esta passagem tenha muito de solidão, também é verdade que somos-com-outros, há uma comunhão de vida, e também de fé, que nos fortalece. Nessas admiráveis “catedrais do sofrimento humano” (como alguém lhe chamou), que são os hospitais, o acompanhamento cristão da dor e da morte é um sinal profundo de amor. A presença fraterna de capelães e voluntários preparados precisa ser solicitada pelo próprio ou por familiares, ao entrar em internamento, ou logo que possível. Na fragilidade e no despojamento que uma doença produz, a presença serena e amiga de quem nos escuta e acolhe, respeita as revoltas e nada impõe, mas abre a uma esperança que está semeada no nosso baptismo é também um milagre da comunhão que Jesus faz.    

Um dia, também eu, espero ser um fiel defunto. Deixarei de ter funções aqui, mas nessa plenitude de Deus, anseio o funcionamento inteiro e sem desgaste, do amor. Que só Deus dá, como diz Fernando Echevarría: “Entardecíamos em Deus. No doce / apuro da sua dádiva. / Era um Outubro cúmplice, por onde / o lúcido licor vinha às palavras / explicitar-se. E ao seu lume a pôr-se / no júbilo do espírito e das águas. / Decantava-se sermos o suporte / desse momento. Da doçura amarga / que altíssima subia pela morte / e dava em vida. Que só Deus nos dava.” 

Pe. Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

A liturgia da Comemoração dos Fiéis Defuntos convida-nos a descobrir que o projecto de Deus para o homem é um projecto de vida. No horizonte final do homem não está a morte, o fracasso, o nada, mas está a comunhão com Deus, a realização plena do homem, a felicidade definitiva, a vida eterna. 

  • No Evangelho, Jesus deixa claro que o objectivo final da sua missão é dar aos homens o “pão” que conduz à vida eterna. Para aceder a essa vida, os discípulos são convidados a “comer a carne” e a “beber o sangue” de Jesus – isto é, a aderir à sua pessoa, a assimilar o seu projecto, a interiorizar a sua proposta. A Eucaristia cristã (o “comer a carne” e beber o sangue” de Jesus) é, ao longo da nossa caminhada pela terra, um momento privilegiado de encontro e de compromisso com essa vida nova e definitiva que Jesus veio oferecer.
  • Na segunda leitura, Paulo garante aos cristãos de Tessalónica que Cristo virá de novo, um dia, para concluir a história humana e para inaugurar a realidade do mundo definitivo; todo aquele que tiver aderido a Jesus e se tiver identificado com Ele irá ao encontro do Senhor e permanecerá com Ele para sempre.
  • Na primeira leitura, Isaías anuncia e descreve o “banquete” que Deus, um dia, vai oferecer a todos os Povos. Com imagens muito sugestivas, o profeta sugere que o fim último da caminhada do homem é o “sentar-se à mesa” de Deus, o partilhar a vida de Deus, o fazer parte da família de Deus. Dessa comunhão com Deus resultará, para o homem, a felicidade total, a vida definitiva.

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