32º Domingo do Tempo Comum - Ano B

08-11-2015 09:54

 

"… ela, na sua pobreza, ofereceu tudo o que tinha, tudo o que possuía para viver Mc 12, 44

 

 

Apesar de todas as crises e dificuldades estamos submersos na cultura do “muito”. Basta ler a notícia de previsão de compras natalícias: “Os consumidores portugueses vão gastar, em média, 241 euros em presentes, o valor mais alto dos últimos cinco anos”. Claro que isto é importante para a economia, e pode ser um verdadeiro sinal “natalício: “Neste Natal, e pelo segundo ano consecutivo, os portugueses vão ser mais generosos, prevendo gastar mais em presentes” (iOnline 2/11/2015). Sem pôr em causa a generosidade em partilhar os bens, vislumbro uma vez mais a apologia do supérfluo e do excesso que a época natalícia acaba por trazer. E retomo a frase inicial: é o “muito” (material) que parece ser a concretização da felicidade!

Não defendo o miserabilismo nem a austeridade indigna e injusta. Nem a ideia de “pobrezinhos mas felizes” que poderia justificar tempos passados ou realidades do mundo mais perto ou distantes de nós. Creio que os bens estão orientados para o bem que com eles se pode fazer, e o acumular egoísta mata mais do que uma epidemia. Mas também creio que a grandeza de uma pessoa não se pode contabilizar em números, e o coração é um “banco mau” para quem nele quiser guardar dinheiro ou coisas. Também somos aquilo que fazemos com o pouco ou com o muito que administramos; a começar por esse dom irredutível que é a vida, e as mil riquezas que cada um traz dentro de si e faz crescer. Por isso o grande perigo do “muito” (material) é fazer-nos esquecer o “tudo” que cada pessoa é, e pode vir a ser! Olhemos para as crianças: quanto mais as “atafulhamos” de coisas, menos desenvolvem o seu interior e os dons que não se pegam com as mãos!

A caminhar para a festa de Cristo Rei a liturgia oferece-nos duas “heroínas” improváveis como modelo de generosidade: duas viúvas, uma em Sarepta na Sidónia, e outra no templo de Jerusalém. No contexto bíblico, e devido à legislação judaica que tornava herdeiros dos bens do marido os seus irmãos, e não a viúva nem os órfãos, “ser viúva” era o mesmo que ser pobre e dependente. A primeira confiou na palavra do profeta Elias e fez-lhe o pão com a farinha que tinha; a segunda, que não deve ter sabido que Jesus a apresentou como exemplo aos discípulos (e hoje a nós), ofereceu os “cêntimos” que possuía para viver. É um choque este despojamento, e quase um escândalo esta mulher não poupar aquele pouco como uma segurança para o futuro, um “pé-de-meia” para um imprevisto, uma “reforma” para a velhice! Há aqui uma confiança que nos escapa. Mas Jesus sublinha o contraste com os ricos que deram do que lhes sobrava, com os doutores da lei que viviam no luxo e a “devorar” as casas das viúvas, e até com a sumptuosidade do Templo que será destruido. Quando o pouco é tudo, e se oferece na confiança (como os cinco pães e os dois peixes da multiplicação) acontece o milagre!   

Dizia Khalil Gibran: “A generosidade não está em dar aquilo que tenho a mais, mas em dar aquilo de que vós precisais mais do que eu.” Descobrir o que verdadeiramente precisa o outro eliminaria muita esmola inútil, e do pouco partilhado por muitos se mudaria o mundo!

 

Pe. Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

A liturgia do 32º Domingo do Tempo Comum fala-nos do verdadeiro culto, do culto que devemos prestar a Deus. A Deus não interessam grandes manifestações religiosas ou ritos externos mais ou menos sumptuosos, mas uma atitude permanente de entrega nas suas mãos, de disponibilidade para os seus projectos, de acolhimento generoso dos seus desafios, de generosidade para doarmos a nossa vida em benefício dos nossos irmãos.

  • A primeira leitura apresenta-nos o exemplo de uma mulher pobre de Sarepta, que, apesar da sua pobreza e necessidade, está disponível para acolher os apelos, os desafios e os dons de Deus. A história dessa viúva que reparte com o profeta os poucos alimentos que tem, garante-nos que a generosidade, a partilha e a solidariedade não empobrecem, mas são geradoras de vida e de vida em abundância.
  • O Evangelho diz, através do exemplo de outra mulher pobre, de outra viúva, qual é o verdadeiro culto que Deus quer dos seus filhos: que eles sejam capazes de Lhe oferecer tudo, numa completa doação, numa pobreza humilde e generosa (que é sempre fecunda), num despojamento de si que brota de um amor sem limites e sem condições. Só os pobres, isto é, aqueles que não têm o coração cheio de si próprios, são capazes de oferecer a Deus o culto verdadeiro que Ele espera.
  • A segunda leitura oferece-nos o exemplo de Cristo, o sumo-sacerdote que entregou a sua vida em favor dos homens. Ele mostrou-nos, com o seu sacrifício, qual é o dom perfeito que Deus quer e que espera de cada um dos seus filhos. Mais do que dinheiro ou outros bens materiais, Deus espera de nós o dom da nossa vida, ao serviço desse projecto de salvação que Ele tem para os homens e para o mundo.

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