30º Domingo do Tempo Comum - Ano A

25-10-2014 10:00

 

 

"Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?” Mt 22, 36

 

 

Não deveria ser fácil escolher, entre os 613 preceitos que se deduziam da Lei de Moisés, qual seria o mais importante! No fundo, havia para todos os gostos e para contentar todos os escrúpulos. O emaranhando de leis, que complicavam a relação com Deus e com os outros, servia bem ao controle das autoridades religiosas pelo medo e pela culpa. É verdade, o medo e a culpa que, tantas vezes, ainda dominam muitas relações, com Deus e com as pessoas. O mesmo medo de que Jesus nos quis salvar com o amor, e a culpa de que nos quis libertar com o perdão! Dois mil anos depois desta clareza com que Jesus escolheu o amor como essencial, continuamos discípulos muito fracos d’Ele. As palavras conhecemo-las “de cor”, mas o jeito que temos para nos enredarmos no acessório, a apetência para a mesquinhez e para o julgamento fácil (dos outros), e o cultivo do “bric-a-brac” religioso parecem mais fortes.

É verdade que o amor é uma aprendizagem. É a expressão mais bela da liberdade com que Deus nos criou. É ele que nos realiza plenamente e nos faz felizes. E se a capacidade de amar não está dependente do amor que recebemos (quantas histórias de sofrimento e drama geraram amores imensos!), é certo que crescer rodeados de amor devia ser o direito básico de todo o ser humano. No mais recente filme de António-Pedro Vasconcelos, o belíssimo “Os gatos não têm vertigens” maravilhei-me com as várias histórias de amor (e da ausência dele) que nos são contadas. Fala do amor que é mais forte que a morte, do amor que significa cuidar (não canta o Caetano Veloso: “Quando a gente gosta / É claro que a gente cuida…“?), do amor que é confiar, e que é deixar-se cativar (“Tu és eternamente responsável por aquilo que cativas”, dizia a raposa ao principezinho de Saint-Exupéry), do amor que é não desistir (“Porque continuas a gostar de mim?” – “Porque de todos os telhados do mundo, tu escolheste o meu!”, diálogo de memória do filme).

O amor é o maior risco da vida. Por isso contrasta tanto com algumas características religiosas que oferecem segurança, em que se acumulam méritos obtidos no “cumprimento dos mandamentos”, e instalam os “crentes” em condomínios fechados de pensamento e preconceito. Aí o amor até pode ser uma palavra conhecida e repetida mas é morta. Porque não se alegra com o maior bem do outro, e não saboreia o abraço feliz que Deus tem para cada um. Sim, o risco de amar é a grande proposta que Jesus tem para nós. Que não significa perder o juízo, mas ser um bocadinho “malucos” como a Rosa e o Joaquim (do filme), retratados no belo poema que Ana Moura canta: “Vivemos sempre sem pedir licença / cantávamos cantigas proibidas / Vencemos os apelos da descrença / que não deixaram mágoas nem feridas / Clandestinos do Amor, sábios e loucos / vivemos de promessas ao luar / Das noites que souberam sempre a pouco / sem saber o que havia para jantar / Mas enquanto olhares para mim eu sou eterna / estou viva enquanto ouvir a tua voz / Contigo não há frio nem inverno / e a música que ouvimos vem de nós.” Amar a Deus de todo o coração e o próximo como a mim mesmo não é um desejo impossível nem um simples mandamento obrigatório: é saber que “um instante sem ti (Deus e os outros) é uma eternidade”!

Pe. Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

 

A liturgia do 30º domingo Comum diz-nos, de forma clara e inquestionável, que o amor está no centro da experiência cristã. O que Deus pede – ou antes, o que Deus exige – a cada crente é que deixe o seu coração ser submergido pelo amor.

  • O Evangelho diz-nos, de forma clara e inquestionável, que toda a revelação de Deus se resume no amor – amor a Deus e amor aos irmãos. Os dois mandamentos não podem separar-se: “amar a Deus” é cumprir a sua vontade e estabelecer com os irmãos relações de amor, de solidariedade, de partilha, de serviço, até ao dom total da vida. Tudo o resto é explicação, desenvolvimento, aplicação à vida prática dessas duas coordenadas fundamentais da vida cristã.
  • A primeira leitura garante-nos que Deus não aceita a perpetuação de situações intoleráveis de injustiça, de arbitrariedade, de opressão, de desrespeito pelos direitos e pela dignidade dos mais pobres e dos mais débeis. A título de exemplo, a leitura fala da situação dos estrangeiros, dos órfãos, das viúvas e dos pobres vítimas da especulação dos usurários: qualquer injustiça ou arbitrariedade praticada contra um irmão mais pobre ou mais débil é um crime grave contra Deus, que nos afasta da comunhão com Deus e nos coloca fora da órbita da Aliança.
  • A segunda leitura apresenta-nos o exemplo de uma comunidade cristã (da cidade grega de Tessalónica) que, apesar da hostilidade e da perseguição, aprendeu a percorrer, com Cristo e com Paulo, o caminho do amor e do dom da vida; e esse percurso – cumprido na alegria e na dor – tornou-se semente de fé e de amor, que deu frutos em outras comunidades cristãs do mundo grego. Dessa experiência comum, nasceu uma imensa família de irmãos, unida à volta do Evangelho e espalhada por todo o mundo grego.

 

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