29º Domingo do Tempo Comum - Ano B

18-10-2015 08:51

 

"Quem entre vós quiser tornar-se grande, será vosso servo.” Mc 10, 43

 

Durante muito tempo, e talvez ainda hoje se mantenha na mente de muitos de nós, as “missões” evocavam sempre um missionário de barbas grandes, batina branca e ar bondoso, rodeado por indígenas dos distantes cantos do mundo. A “missão” lembrava terras longínquas e gentes que ainda não “conheciam Nosso Senhor”, mas foi-se tornando uma palavra mais presente à medida que crescia a urbanização na Europa, e o desenraízamento cultural e religioso ia ganhando espaço. Já o Cardeal Cerejeira dizia que a missão “começa às portas de Lisboa”. E vemos, cada vez mais, que começa na identidade de cada um de nós, discípulos de Jesus Cristo. 

O Papa Francisco relembra, na sua Mensagem para o Dia Mundial das Missões: “A missão não é proselitismo, nem mera estratégia; a missão faz parte da «gramática» da fé, é algo de imprescindível para quem se coloca à escuta da voz do Espírito, que sussurra «vem» e «vai». Quem segue Cristo não pode deixar de tornar-se missionário.” E sintetiza: “A missão é uma paixão por Jesus Cristo e, ao mesmo tempo, uma paixão pelas pessoas.” E é essa coerência de vida assente no serviço que o Papa Francisco tem interpelado, em especial os mais responsáveis na Igreja: denunciando, entre outras, “a doença do proveito mundano, dos exibicionismos, quando o apóstolo transforma o seu serviço em poder e o seu poder em mercadoria para obter dividendos humanos ou mais poder”, aos membros da Cúria romana (22.12.2014), e alertando os bispos dos Estados Unidos que “é útil ao bispo possuir a clarividência do líder e a esperteza do administrador, mas decaímos inexoravelmente quando confundimos a potência da força com a força da impotência, através da qual Deus nos redimiu”(23.09.2015).

Se isto dissesse apenas respeito aos bispos e cardeais, podíamos passar de lado! Mas Tiago e João, com o seu pedido dos lugares à direita e à esquerda de Jesus desmascaram os nossos desejos de poder e importância. Mesmo, e principalmente, quando estamos em “missões” sagradas. Será que nos julgamos acima dos outros? Ou vale sempre a pena “meter uma cunha”? Só quando sintonizamos com a lógica de servir que Jesus nos dá, é possível ultrapassar estas tentações. “O sonho missionário de chegar a todos” (da Evangelii Gaudium, e lema do Sínodo Diocesano de Lisboa) não é “angariação de novos sócios”, nem “nostalgia da cristandade perdida”, mas doação de vida, como Jesus, para que todos “tenham vida em abundância”! É compromisso em favor do homem todo e de todos os homens e mulheres, é trabalho de humanização onde há injustiça e de divinização onde não há sonhos, é paixão e morte para que todos ressuscitem!

O que ficava gravado, e continua a gravar-se, no coração de quem recebe um anúncio de Cristo, é a vida que dá corpo à palavra. Reconhece-se o amor e o serviço quase imediatamente; e a falsidade e o oportunismo também. Servir não é exclusivo de nenhuma religião ou grupo, mas é o “modo cristão de entender a verdadeira realização da vida humana, unida à de Jesus, aquela que pode trazer ao mundo a alegria, a simplicidade de coração e a paz” (Gaspar Mora). Como se dizia no filme “A vida é bela”, de Roberto Benigni: “Servire è l'arte suprema; Dio è il primo servitore”. Sim, “Deus é o primeiro servidor”!

Pe. Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

 

A liturgia do 29º Domingo do Tempo Comum lembra-nos, mais uma vez, que a lógica de Deus é diferente da lógica do mundo. Convida-nos a prescindir dos nossos projectos pessoais de poder e de grandeza e a fazer da nossa vida um serviço aos irmãos. É no amor e na entrega de quem serve humildemente os irmãos que Deus oferece aos homens a vida eterna e verdadeira.

  • A primeira leitura apresenta-nos a figura de um “Servo de Deus”, insignificante e desprezado pelos homens, mas através do qual se revela a vida e a salvação de Deus. Lembra-nos que uma vida vivida na simplicidade, na humildade, no sacrifício, na entrega e no dom de si mesmo não é, aos olhos de Deus, uma vida maldita, perdida, fracassada; mas é uma vida fecunda e plenamente realizada, que trará libertação e esperança ao mundo e aos homens.
  • No Evangelho, Jesus convida os discípulos a não se deixarem manipular por sonhos pessoais de ambição, de grandeza, de poder e de domínio, mas a fazerem da sua vida um dom de amor e de serviço. Chamados a seguir o Filho do Homem “que não veio para ser servido, mas para servir e dar a vida”, os discípulos devem dar testemunho de uma nova ordem e propor, com o seu exemplo, um mundo livre do poder que escraviza.
  • Na segunda leitura, o autor da Carta aos Hebreus fala-nos de um Deus que ama o homem com um amor sem limites e que, por isso, está disposto a assumir a fragilidade dos homens, a descer ao seu nível, a partilhar a sua condição. Ele não Se esconde atrás do seu poder e da sua omnipotência, mas aceita descer ao encontro homens para lhes oferecer o seu amor.

portugal@dehonianos.org – www.dehonianos.org