27º Domingo do Tempo Comum - Ano C
No evangelho de São Lucas os discípulos fazem a Jesus dois pedidos singulares: “Ensina-nos a rezar.” (11, 1) e “Aumenta a nossa fé.” (17, 5). Não são ocasionais estes pedidos: o primeiro surge depois de verem Jesus rezar; o segundo depois de uma “conversa” sobre o perdão. Do exemplo e da radicalidade das palavras de Jesus não nasce essa abertura que é base de toda a religião: ser com e como Deus? Por isso o tema da fé é centralíssimo no cristianismo, como no de todas as religiões.
Mas o que dizemos quando dizemos “fé”? Quase sempre lhe juntamos o verbo “ter”: “ter ou não ter fé”. Como se fosse algo simplesmente “material”, que se pudesse pôr num bolso ou guardar num cofre, ou até ser objecto de um exame. É a ideia de que a fé é essencialmente uma lista de “conteúdos”, de dogmas e tradições, dos parágrafos do Catecismo. Claro que há uma inteligência da fé, um “credo” que sintetiza e une, uma procura racional das razões da nossa esperança. Acreditar não é um acto de irracionalidade. Mas não se reduz a um saber, distinto do sabor que a vida ganha para quem tem fé. É a vida organizada segundo princípios fundamentais, pelos quais “damos a vida”, e a fé cristã é viver com e como Cristo. Essa é a fé que move montanhas, pois ao pensar, sentir e agir como Jesus, encontramos a forma mais divina de sermos humanos. Mais do que os dogmas, o que faz mover as montanhas (e poderíamos pensar nas “montanhas” das guerras, das injustiças, da desumanidade, da indiferença, e também nos “montinhos” que cada um de nós bem conhece!) é amar como Jesus!
Diz o teólogo Hans Urs von Balthasar, no pequeno livro já surpreendente pelo título - “Só o amor é digno de fé”: “Só o amor é credível, nada mais do que o amor pode e deve ser crido. A realização, a “obra da fé”, consiste em reconhecer esta prioridade absoluta do amor, por nada alcançável e acessível. Crer que o amor, o amor absoluto existe – e tal como realidade última, sem nada mais além. [...] A primeira coisa que, na fé dos cristãos, deveria surpreender um não-cristão é que eles, de um modo visível, arriscam demasiado.” Sim, há um risco demasiado em viver a fé que é já-quase-só-amor. Pois a fé está marcada com o sinal da cruz traçada sobre cada um em cada momento comunitário de oração: da cabeça ao peito e de um ombro ao outro, como que a dizer que a inteligência e o coração determinam a força para viver com e como Cristo
Um novo ano pastoral começa em cada início de Outono. Velhos ritmos e novos desafios agitam as nossas comunidades. A alegria do serviço que vence o perfeccionismo e o egoísmo é um bom contágio de renovação. No gosto de aprofundar a inteligência da fé, no debate de ideias, na reflexão partilhada, na vontade de sonhar, e na vida transformada os pequenos grãos de mostarda podem tornar-se belas árvores. Conheçamos as verdades “sem as quais não podíamos viver” e concretizemo-las em amor efectivo!
Pe. Vitor Gonçalves
in Voz da Verdaede
Na Palavra de Deus que hoje nos é proposta, cruzam-se vários temas (a fé, a salvação, a radicalidade do “caminho do Reino”, etc.); mas sobressai a reflexão sobre a atitude correcta que o homem deve assumir face a Deus. As leituras convidam-nos a reconhecer, com humildade, a nossa pequenez e finitude, a comprometer-nos com o “Reino” sem cálculos nem exigências, a acolher com gratidão os dons de Deus e a entregar-nos confiantes nas suas mãos.
- Na primeira leitura, o profeta Habacuc interpela Deus, convoca-o para intervir no mundo e para pôr fim à violência, à injustiça, ao pecado… Deus, em resposta, confirma a sua intenção de actuar no mundo, no sentido de destruir a morte e a opressão; mas dá a entender que só o fará quando for o momento oportuno, de acordo com o seu projecto; ao homem, resta confiar e esperar pacientemente o “tempo de Deus”.
- O Evangelho convida os discípulos a aderir, com coragem e radicalidade, a esse projecto de vida que, em Jesus, Deus veio oferecer ao homem… A essa adesão chama-se “fé”; e dela depende a instauração do “Reino” no mundo. Os discípulos, comprometidos com a construção do “Reino” devem, no entanto, ter consciência de que não agem por si próprios; eles são, apenas, instrumentos através dos quais Deus realiza a salvação. Resta-lhes cumprir o seu papel com humildade e gratuidade, como “servos que apenas fizeram o que deviam fazer”.
- A segunda leitura convida os discípulos a renovar cada dia o seu compromisso com Jesus Cristo e com o “Reino”. De forma especial, o autor exorta os animadores cristãos a que conduzam com fortaleza, com equilíbrio e com amor as comunidades que lhes foram confiadas e a que defendam sempre a verdade do Evangelho.
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