1º Domingo da Quaresma - Ano C
“Tendo terminado toda a espécie de tentação, retirou-se da presença de Jesus, até certo tempo.” Lc 4, 13
A verdade do “não”
O Papa trocou-me as voltas. Estava eu, de armas e bagagens, dedos sobre o teclado,
à porta do deserto para reflectir convosco o episódio das tentações de Jesus, quando
a notícia correu como fogo em seara seca: “O Papa vai abandonar a liderança da igreja dia 28”!
E todas as boas intenções de reflexão passaram para segundo plano perante o espanto de tal notícia.
Chovem e vão continuar a chover inúmeros comentários, a propósito e a despropósito, e tinha prometido
a mim mesmo não engrossar tal enxurrada mas não resisti à tentação.
Primeiro alegrou-me a capacidade de Bento XVI nos surpreender (e surpreender o mundo)
ao mostrar que a Igreja é mais do que ele, e que Deus nos confia missões mas ninguém O substitui.
A inteligência e liberdade desta decisão são um verdadeiro sopro de vitalidade para um serviço que
não pode viver acorrentado a nenhum poder despótico, e ajude a reflectir corajosamente a autoridade
e a corresponsabilidade na vida eclesial. É preciso evitar cair na tentação de entrar em comparações
com a vida de João Paulo II. Quando o amor à verdade e a consciência de limites pessoais se exprimem
numa real fragilidade, não tocamos também aí a grandeza do amor de Deus?
Às vezes as tentações não se manifestam em propostas novas mas no arrastar de
modelos antigos. Não é um pouco isso que Jesus tem de vencer no seu deserto
(que vai ser também o nosso)? Que modelos mais antigos, do que o poder só em
benefício de si e dos seus, o ter para dominar os que nada têm, e a ostentação e
soberba de querer pôr Deus ao seu serviço? “O diabo sabe muito porque é velho”
costuma dizer o nosso povo, assim como são velhas também as suas propostas.
Para isso conta com a inércia e o acomodamento de quem não ousa sonhar nem
acreditar que a vida pode ser diferente e mais feliz. Somos nós quando pensamos que
“só repetir é bom”, que “sempre se fez assim”, e que fazemos da vida, da fé, e até do amor,
uma organização burocrática e planeada. Encanta-me a surpresa e a novidade com que Jesus
contagia a nossa vida. Diz vários “nãos” porque há um “sim” sempre maior e mais belo adiante
de cada “não”. É neles que nos convida a apostar, com o risco de tudo e a verdade de não
sermos “super-homens”. Mas de sermos infinitamente amados! E não é na força do amor de Jesus
que a Igreja e o Evangelho têm os fundamentos? E não é esse mesmo amor que todos os dia
nos estimula a viver com espanto e agradecimento? Que “nãos” precisamos dizer para que
seja mais claro e feliz o “sim” que nos aquece o coração?
P. Vítor Gonçalves
in Voz da Verdade 17.03.3013
Tema do 1º Domingo da Quaresma
No início da Quaresma, a Palavra de Deus apela a repensar as nossas opções de vida e a tomar consciência dessas “tentações” que nos impedem de renascer para a vida nova, para a vida de Deus.
- A primeira leitura convida-nos a eliminar os falsos deuses em quem às vezes apostamos tudo e a fazer de Deus a nossa referência fundamental. Alerta-nos, na mesma lógica, contra a tentação do orgulho e da auto-suficiência, que nos levam a caminhos de egoísmo e de desumanidade, de desgraça e de morte.
- O Evangelho apresenta-nos uma catequese sobre as opções de Jesus. Lucas sugere que Jesus recusou radicalmente um caminho de materialismo, de poder, de êxito fácil, pois o plano de Deus não passava pelo egoísmo, mas pela partilha; não passava pelo autoritarismo, mas pelo serviço; não passava por manifestações espectaculares que impressionam as massas, mas por uma proposta de vida plena, apresentada com simplicidade e amor. É claro que é esse caminho que é sugerido aos que seguem Jesus.
- A segunda leitura convida-nos a prescindir de uma atitude arrogante e auto-suficiente em relação à salvação que Deus nos oferece: a salvação não é uma conquista nossa, mas um dom gratuito de Deus. É preciso, pois, “converter-se” a Jesus, isto é, reconhecê-l’O como o “Senhor” e acolher no coração a salvação que, em Jesus, Deus nos propõe.
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