6º Domingo do Tempo Comum - Ano A
“Se a vossa justiça não superar a dos escribas e fariseus, não entrareis no reino dos Céus.” Mt 5, 20
O alto do monte onde Jesus diz as bem-aventuranças e apresenta a “lei nova do amor” é o ambiente ideal para entender a exigência das suas palavras. É possível ver mais longe e propor a “vida com sinal ‘mais’” que completa a lei de Israel sem a abolir. Nas seis afirmações que tocam temas fundamentais, da vida, da relação com Deus e com os irmãos, da fidelidade no amor, do respeito pela dignidade dos outros, do valor das palavras, da justiça e da vingança, e do trato com os inimigos, Jesus vai além dos “mínimos olímpicos” que a Lei propunha. Não apresenta uma lei nova, mas revela a plenitude do amor como critério fundamental.
É possível ficar na beleza poética das bem-aventuranças, e habituarmo-nos a uma vida “assim-assim”. Como dizia Fernando Pessoa, “[…] Sem que um sonho, no erguer de asa, / Faça até mais rubra a brasa / Da lareira a abandonar! "A novidade proposta por Jesus não passa simplesmente pelo cumprimento de uma lei ou preceito. Vai mais fundo, quer transformar-nos por dentro e fazer-nos sintonizar com a vida em plenitude que Ele nos oferece.
Não se trata apenas de “não matar”; é preciso abandonar todas as “mortes” que impedem a reconciliação, que geram distanciamento e indiferença, que iludem com a possibilidade de “estar de bem” com Deus, mesmo guardando rancor ou ódio a outros, que apelam a uma justiça humana fechando portas ao amor que tem a fonte em Deus. Nem de “não cometer adultério”; é preciso ter um coração unificado, assumir que o outro nunca pode ser objecto ao serviço do meu egoísmo, que só a verdade liberta e a aparência escraviza, que a violência é sempre contrária ao amor, e o “sim” é para renovar cada dia. Pois a fidelidade faz sentido na relação com o outro. É sempre ser fiel a uma pessoa mais do que a uma instituição ou a um vínculo. É sempre alguém que amo e prometo amar, e isso implica um amor criativo que se renova no tempo. Um amor morto ou uma convivência aborrecida não se pode chamar fidelidade.
A máxima exigência que Jesus apresenta não é permissão de julgar, condenar ou marginalizar quem quer que seja. Não pode ser verdadeiro o amor a Deus se não é amor concreto pelo próximo, nas realidades felizes ou dolorosas de cada um. É aí que o “mais” de Deus abraça e salva o nosso “menos”!
Pe. Vitor Gonaçalves
in Voz da Verdade
A liturgia de hoje garante-nos que Deus tem um projecto de salvação para que o homem possa chegar à vida plena e propõe-nos uma reflexão sobre a atitude que devemos assumir diante desse projecto.
- Na segunda leitura, Paulo apresenta o projecto salvador de Deus (aquilo que ele chama "sabedoria de Deus" ou "o mistério"). É um projecto que Deus preparou desde sempre "para aqueles que o amam", que esteve oculto aos olhos dos homens, mas que Jesus Cristo revelou com a sua pessoa, as suas palavras, os seus gestos e, sobretudo, com a sua morte na cruz (pois aí, no dom total da vida, revelou-se aos homens a medida do amor de Deus e mostrou-se ao homem o caminho que leva à realização plena).
- A primeira leitura recorda, no entanto, que o homem é livre de escolher entre a proposta de Deus (que conduz à vida e à felicidade) e a auto-suficiência do próprio homem (que conduz, quase sempre, à morte e à desgraça). Para ajudar o homem que escolhe a vida, Deus propõe "mandamentos": são os "sinais" com que Deus delimita o caminho que conduz à salvação.
- O Evangelho completa a reflexão, propondo a atitude de base com que o homem deve abordar esse caminho balizado pelos "mandamentos": não se trata apenas de cumprir regras externas, no respeito estrito pela letra da lei; mas trata-se de assumir uma verdadeira atitude interior de adesão a Deus e às suas propostas, que tenha, depois, correspondência em todos os passos da vida.