5º Domingo do Tempo Comum - Ano A
“…nem se acende uma lâmpada para a colocar debaixo do alqueire.” Mt 5, 15
As grandes mudanças não acontecem por decreto. E no que tem a ver com as pessoas é a descoberta paciente dos outros que melhor produz as mudanças interiores. Por mais que nos horrorize, a guerra na Ucrânia ou a violência familiar, que os números podem fazer esquecer pessoas e histórias infernais, é complicado entrar no coração humano e mudar-lhe o rumo. Deus o sabe e nós vamos sabendo! Por isso não podemos deixar crescer a indiferença, e ter coragem para criar redes de escuta e ajuda concreta. O pouco que cada um pode fazer, importa juntar-se ao de outros e crescer como uma luz que se alastra. O “pão aos famintos”, a “pousada aos pobres”, a “roupa ao que não tem que vestir”, e “não voltar a costa ao teu semelhante” são os sinais luminosos que Isaías e outros profetas anunciaram.
Quantas vezes o que ajuda a curar alguns sofrimentos da alma é concretizar a fraternidade. Pois a dureza do coração, a insensibilidade ao injustiçado, a habituação ao que está mal fecham-nos em bolhas de egoísmo. Se não concordamos com o mal não adianta gritar contra Deus: se o vemos e não nos conformamos, é porque Deus está a contar connosco para a mudança das situações. Ser sal e luz do mundo, e colocar alto a luz que se acendeu nunca é fácil, mas é a identidade de quem quer seguir Jesus Cristo!
Curiosamente, a escuridão é, afinal, a falta de luz! Desde sempre o homem procurou guardar um pouco do sol para a noite. O fogo, a vela, a electricidade, são sinais deste desejo de luz. Que também os nossos gestos podem ser luz ou trevas nem sempre estamos convencidos disso. Ainda que Jesus o tenha dito nas suas primeiras palavras. Tantas vezes é quando nos faltam aqueles que foram semeando luz à nossa volta, que voltamos a perceber o frio da noite. Uma mãe, um amigo, um professor ou até um vizinho que tornava as manhãs radiantes de alegria com a sua boa disposição! Quem nos ajuda a não esconder a luz que Deus acendeu em nós?
É tão bom encontrar estes “portadores de luz” que nos anunciam que “a noite será como o meio-dia”. “Se não puderes ser o sol, sê uma estrela / Não é pelo tamanho que terás êxito ou fracasso”, diz Douglas Malloch num belo poema. Quem mede a importância de uma luz senão aquele que dela necessita? É urgente a luz para quem faz e quem sofre nas guerras, para quem “manda” no mundo, para quem desanima e perde a esperança, para quem se gasta a levar vida e luz a todo o lado. Essa luz que é Cristo em cada pessoa, porque Deus a ama. “Mehr Licht”, “Mais Luz”, foi a última vontade do poeta alemão Goethe!
Pe. Vitor Gonçalves
in Voz da Verdade
A Palavra de Deus deste 5º Domingo do Tempo Comum convida-nos a reflectir sobre o compromisso cristão. Aqueles que foram interpelados pelo desafio do "Reino" não podem remeter-se a uma vida cómoda e instalada, nem refugiar-se numa religião ritual e feita de gestos vazios; mas têm de viver de tal forma comprometidos com a transformação do mundo que se tornem uma luz que brilha na noite do mundo e que aponta no sentido desse mundo de plenitude que Deus prometeu aos homens - o mundo do "Reino".
- No Evangelho, Jesus exorta os seus discípulos a não se instalarem na mediocridade, no comodismo, no "deixa andar"; e pede-lhes que sejam o sal que dá sabor ao mundo e que testemunha a perenidade e a eternidade do projecto salvador de Deus; também os exorta a serem uma luz que aponta no sentido das realidades eternas, que vence a escuridão do sofrimento, do egoísmo, do medo e que conduz ao encontro de um "Reino" de liberdade e de esperança.
- A primeira leitura apresenta as condições necessárias para "ser luz": é uma "luz" que ilumina o mundo, não quem cumpre ritos religiosos estéreis e vazios, mas quem se compromete verdadeiramente com a justiça, com a paz, com a partilha, com a fraternidade. A verdadeira religião não se fundamenta numa relação "platónica" com Deus, mas num compromisso concreto que leva o homem a ser um sinal vivo do amor de Deus no meio dos seus irmãos.
- A segunda leitura avisa que ser "luz" não é colocar a sua esperança de salvação em esquemas humanos de sabedoria, mas é identificar-se com Cristo e interiorizar a "loucura da cruz" que é dom da vida. Pode-se esperar uma revelação da salvação no escândalo de um Deus que morre na cruz? Sim. É na fragilidade e na debilidade que Deus Se manifesta: o exemplo de Paulo - um homem frágil e pouco brilhante - demonstra-o.