4º Domingo do Tempo Comum - Ano A
“Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o reino dos Céus.” Mt 5, 2
Talvez não nos demos conta, mas vamos escrevendo ao longo da vida as “nossas bem-aventuranças pessoais”. Elas são as escolhas que fazemos, os hábitos a que nos agarramos, as esperanças que nos movem. Frágeis ou corajosas, egoístas ou generosas, fechadas ou abertas revelam como estamos sempre em crescimento. Será que já alguma vez subimos ao “monte” da vida, onde se veem os passos andados e o horizonte que queremos alcançar? E que tal uma pequena paragem a escrever as “bem-aventuranças” que nos guiam?
O discurso programático de Jesus, dito no monte sobranceiro ao mar da Galileia, que o evangelista Mateus nos oferece, abre com a melodia maravilhosa das “Bem-aventuranças”. Maravilhosas e revolucionárias, pois quem se compromete com o mundo e com a história encontra nelas acolhimento. Jesus di-las no plural porque são incontáveis os bem-aventurados que o são, até sem o saberem. Aqueles que estão mais próximos de Deus do que pensam, ou do que alguns dizem. É na sua coragem e inconformismo que todos nós enriquecemos. Na escola de Jesus estimula-se a arte de pensar, de colocar as questões e procurar em comum as respostas, de dar o sangue pela verdade, de não se calar diante do mal, de apontar caminhos que exigem sacrifícios, de tornar possível a esperança!
Como o horizonte largo onde Jesus no-las ofereceu, estas palavras de felicidade ecoam dentro de quem as escuta. Falam da pobreza, que abre à riqueza de Deus em nós e nos outros. Revelam que a humildade é a terra onde tudo pode germinar e crescer. Consagram as lágrimas que, tantas vezes, lavam os olhos para nos reconhecermos irmãos. Abrem a alma às situações de injustiça e ensinam o compromisso com a mudança. Acordam a misericórdia que é o coração de Deus a bater em nós. Restauram a transparência para tudo vermos com o olhar de Deus. Comprometem as mãos de todos com a paz. Prometem o reino aos perseguidos por amor da justiça.
Na linha do convite inicial destas linhas poderíamos tentar descobrir como as bem-aventuranças se concretizam em vidas e histórias concretas, mais longe ou bem perto. Seria um exercício semelhante ao do admirável espectáculo “Todas as coisas maravilhosas” que o actor Ivo Canelas tem apresentado em várias cidades, e está até Março em Lisboa. Pequenas e grandes maravilhas que se podem espalhar como sementes. Que germinam e crescem onde e em quem menos se espera! Talvez ajudem a descobrir o rosto bom, belo e feliz de Deus!
Pe. Vitor Gonçalves
in Voz da Verdade
As leituras deste domingo propõem-nos uma reflexão sobre o "Reino" e a sua lógica. Mostram que o projecto de Deus - o projecto do "Reino" - roda em sentido contrário à lógica do mundo... Nos esquemas de Deus - ao contrário dos esquemas do mundo - são os pobres, os humildes, os que aceitaram despir-se do egoísmo, do orgulho, dos próprios interesses que são verdadeiramente felizes. O "Reino" é para eles.
- Na primeira leitura, o profeta Sofonias denuncia o orgulho e a auto-suficiência dos ricos e dos poderosos e convida o Povo de Deus a converter-se à pobreza. Os "pobres" são aqueles que se entregam nas mãos de Deus com humildade e confiança, que acolhem com amor as suas propostas e que são justos e solidários com os irmãos.
- Na segunda leitura, Paulo denuncia a atitude daqueles que colocam a sua esperança e a sua segurança em pessoas ou em esquemas humanos e que assumem atitudes de orgulho e de auto-suficiência; e convida os crentes a encontrar em Cristo crucificado a verdadeira sabedoria que conduz à salvação e à vida plena.
- O Evangelho apresenta a magna carta do "Reino". Proclama "bem-aventurados" os pobres, os mansos, os que choram, os que procuram cumprir fielmente a vontade de Deus, porque já vivem na lógica do "Reino"; e recomenda aos crentes a misericórdia, a sinceridade de coração, a luta pela paz, a perseverança diante das perseguições: essas são as atitudes que correspondem ao compromisso pelo "Reino".