31º Domingo do Tempo Comum - Ano B
"Qual é o primeiro de todos os mandamentos?"
Mc 12, 28b
Este é o número de preceitos e mandamentos que os rabinos do tempo de Jesus tinham encontrado nos cinco primeiros livros da Bíblia. Cumpri-los era a tarefa que cada judeu devia abraçar. 365 (como os dias do ano) eram as acções a evitar; 248 (como os membros do corpo) as acções a praticar. Bem, as mulheres estavam isentas de cumprir os 248 positivos! Claro que muitos procuravam resumi-los, sintetizá-los e estabelecer prioridades. A lógica da contabilidade não faz crescer o amor. Pode gerar perfeccionistas, “heróis” e “recordistas”, mas não faz santos. Quem conta o que oferece, quem mede o que dá, não conhece a alegria da gratuidade. E facilmente começa a julgar os outros!
A extensa lista de preceitos da lei de Israel ficou resumida por Jesus no mandamento “entrelaçado” do amor a Deus e ao próximo. Ficou pouco trabalho para os legalistas e fiscalizadores das infrações! Se as cerimónias grandiosas e as liturgias sublimes feitas a Deus podiam valer tanto, ou menos, que um pouco de pão dado a quem tem fome, ou um gesto de carinho a quem sofre, para onde iria a religião? Mais do que o “muito”, Jesus pede o “todo”: coração, alma, força e inteligência. Sem separar Deus e o próximo: não se ama verdadeiramente com divisões, e só chegamos a Deus e aos outros inteiros. Bem o disse Clarice Lispector: “Não suporto meios termos. Por isso, não me doo pela metade. Não sou sua meio amiga nem seu quase amor. Ou sou tudo ou sou nada”! Se o mandamento fundamental é o amor, então a religião chama-se caridade, luta pela justiça, serviço aos pobres, procura da verdade, construção da paz, louvor a Deus pelos dons da vida! Não tinha razão Santo Agostinho quando dizia: “Ama e faz o que quiseres!”?
Como entender a fé se ela não é assumida a partir de dentro de cada um de nós, como uma flor de inexprimível beleza? Não como cumprimento vazio de hábitos e liturgias, nem como luta entre o tempo dado a Deus, e o tempo de trabalho ou de vida partilhada com os outros. Só o amor pode fazer a unidade! Será que ainda se apresenta Deus como ciumento e invejoso do “tempo que não gastamos com Ele” (talvez em orações, liturgias e ‘coisas da Igreja’)? Acreditar em Deus faz-nos crescer num amor maior à vida, aos outros, ao próprio mundo?
O amor é uno, abraça Deus no homem, compromete-nos com a salvação de todos, é a derrota da divisão, da indiferença, da auto-suficiência. Quando tantos dizem que já não acreditam no amor, é preciso dizer-lhes que aquilo que deixaram de acreditar foi no “amor sem amor”. Pois o amor é uma criação quotidiana, está dentro de nós para ser dado e ninguém pode dizer que não o tem. Podemos não o sentir, mas porque vimos de Deus, o mais íntimo de nós mesmos é Amor! E assim, os santos, como disse Maria de Lurdes Belchior, são aqueles em que "o seupresente era já quase só amor"
Pe. Vitor Gonçalves
in Voz da Verdade.
A liturgia do 31° Domingo do Tempo Comum diz-nos que o amor está no centro da experiência cristã. O caminho da fé que, dia a dia, somos convidados a percorrer, resume-se no amor Deus e no amor aos irmãos - duas vertentes que não se excluem, antes se complementam mutuamente.
- A primeira leitura apresenta-nos o início do "Shema' Israel" - a solene proclamação de fé que todo o israelita devia fazer diariamente. É uma afirmação da unicidade de Deus e um convite a amar a Deus com todo o coração, com toda a alma e com todas as forças.
- O Evangelho diz-nos, de forma clara e inquestionável, que toda a experiência de fé do discípulo de Jesus se resume no amor - amor a Deus e amor aos irmãos. Os dois mandamentos não podem separar-se: "amar a Deus" é cumprir a sua vontade e estabelecer com os irmãos relações de amor, de solidariedade, de partilha, de serviço, até ao dom total da vida. Tudo o resto é explicação, desenvolvimento, aplicação à vida prática dessas duas coordenadas fundamentais da vida cristã.
- A segunda leitura apresenta-nos Jesus Cristo como o sumo-sacerdote que veio ao mundo para cumprir o projecto salvador do Pai e para oferecer a sua vida em doação de amor aos homens. Cristo, com a sua obediência ao Pai e com a sua entrega em favor dos homens, diz-nos qual a melhor forma de expressarmos o nosso amor a Deus.
Pe. Joaquim Garrido - Pe. Manuel Barbosa - Pe. Ornelas Carvalho