XVI Domingo do Tempo Comum - Ano C

21-07-2019 09:14

 

 

“Marta, Marta, andas inquieta e preocupada com muitas coisas, quando uma só é necessária.” Lc 10,41-42

 

Demasiadas vezes se olhou para o relato de Jesus em casa de Marta e Maria como uma exaltação da vida contemplativa sobre a vida activa. Maria seria a figura de todos os consagrados, privilegiados na proximidade de Deus, e Marta, a representante de todos os que trabalham, e se preocupam com as coisas do dia a dia. Sairia assim desvalorizado o trabalho humano e exaltado um misticismo desencarnado!

Jesus é apresentado em numerosas situações (e em especial por S. Lucas) à mesa, nas casas mais improváveis. Com justos e fariseus, com publicanos e pecadores. Hoje, na casa de duas irmãs. O que ainda é mais extraordinário pelo papel secundário dado então às mulheres! No acolhimento e na intimidade da casa, a presença de Jesus é o centro de qualquer encontro. Por isso, a atarefada Marta não é censurada pelo trabalho mas pela agitação, a preocupação, o espírito de funcionária cheia de “etiqueta de boas maneiras” que secundariza o convidado. O seu agir é funcional e ao serviço da tradição, preocupada, certamente, em oferecer coisas ao convidado em vez de companhia. Maria, ao contrário, sentada aos pés de Jesus, como verdadeira discípula, escuta a sua palavra. Até apetece chamá-la “sonsa”, mas será que havia assim tanto a fazer para que Marta não tivesse a mesma atitude? Tão inquieta com o que queria oferecer a Jesus, não acolheu o que Ele lhes queria oferecer. A “boa parte” (que é também “bela”) que Maria escolheu não foi a preguiça ou o desinteresse, mas o alimento da palavra que Jesus vinha trazer.

Há tempo para tudo. E o importante é saber escolher. Quando Jesus vem à casa da nossa vida, a casa torna-se d’Ele, e nós somos os hóspedes, sentados como Maria a seus pés. Do acolhimento de Jesus à acção: é este o movimento do verdadeiro serviço. Pois a actividade febril, o activismo e o excesso de trabalho, que não se alimentam da Palavra que é Cristo, correm o risco de se tornarem preocupação, problema, conflito e confusão, protagonismo excessivo de nós mesmos. Escutar a Palavra é condição para estabelecer prioridades, organizar e delegar trabalhos, reunir competências, e actuar em comunhão. Não em nome da eficácia ou da tradição, ma sem nome d’Aquele que dá sentido a todas as coisas. É de todos os tempos o que dizia um velho rabino acerca de um colega: “Anda tão ocupado com as coisas de Deus, que até se esquece de que Ele existe!”

Habitam em nós Marta e Maria. São o serviço e a escuta de Jesus. Acolher o céu para melhor cuidar da terra, é deixarmo-nos assim guiar pela presença de Jesus, que conta com as nossas mãos para fazer novas todas as coisas. Não é “uma ou outra”, nem “uma contra a outra”, mas primeiro, Maria, e depois, Marta! E não será então que todo o trabalho se torna criação e colaboração feliz com Deus?

in Voz da Verdade

Padre Vitor Gonçalves

 

As leituras deste domingo convidam-nos a reflectir o tema da hospitalidade e do acolhimento. Sugerem, sobretudo, que a existência cristã é o acolhimento de Deus e das suas propostas; e que a acção (ainda que em favor dos irmãos) tem de partir de um verdadeiro encontro com Jesus e da escuta da Palavra de Jesus. É isso que permite encontrar o sentido da nossa acção e da nossa missão.

  • A primeira leitura propõe-nos a figura patriarcal de Abraão. Nessa figura apresenta-se o modelo do homem que está atento a quem passa, que partilha tudo o que tem com o irmão que se atravessa no seu caminho e que encontra no hóspede que entra na sua tenda a figura do próprio Deus. Sugere-se, em consequência, que Deus não pode deixar de recompensar quem assim procede.
  • No Evangelho, apresenta-se um outro quadro de hospitalidade e de acolhimento de Deus. Mas sugere-se que, para o cristão, acolher Deus na sua casa não é tanto embarcar num activismo desenfreado, mas sentar-se aos pés de Jesus, escutar as propostas que, n'Ele, o Pai nos faz e acolher a sua Palavra.
  • A segunda leitura apresenta-nos a figura de um apóstolo (Paulo), para quem Cristo, as suas palavras e as suas propostas são a referência fundamental, o universo à volta do qual se constrói toda a vida. Para Paulo, o que é necessário é "acolher Cristo" e construir toda a vida à volta dos seus valores. É isso que é preponderante na experiência cristã.

Grupo Dinamizador:

P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho