Solenidade da Santíssima Trindade - Ano C

16-06-2019 08:31

 

 

 

“Tenho ainda muitas coisas para vos dizer, mas não as podeis compreender agora.” Jo 16, 12

 

 

 

Faltam poucos minutos para as três. Da tarde. A hora limite para “dar à luz” estas palavras. E gostaria de criar novas histórias para falar do maior dos mistérios. Maior, porque é fonte e é foz, e n’Ele tudo é claro e é pleno. Mais histórias porque não sei pintar nem sou compositor, e só a beleza nos permite entrar descalços em sua casa. E recordo três histórias, que não são minhas, mas sabe bem contá-las.

A primeira passa-se à beira do Mediterrâneo, ainda sem o drama dos que arriscam a vida em frágeis embarcações para procurar melhor vida do outro lado. Agostinho, Bispo de Hipona, planeia a sua obra sobre “A Trindade”, e distrai-se com um menino que traz na concha das mãos água do mar para uma pequena cova na areia. Inglório esforço que repete sem se fatigar. Mete conversa e sorri com o ousado projecto que o pequeno lhe revela: “Quero pôr o mar dentro desta covinha!” Procurando mitigar a desilusão infantil, apela à lógica de tal impossibilidade. Surpreende-o a resposta, por entre um sorriso de criança: “Pois fica sabendo que é mais fácil colocar todo o mar neste pequeno buraco do que tu, apenas com a tua inteligência humana, compreenderes o mistério da Santíssima Trindade”! A obra foi escrita, e está cheia de luz, que convida à humildade de entrar sem possuir!

A segunda pode ter acontecido numa aldeia do nosso país, onde o desejo de um pároco em fazer entender os mistérios da fé o inspirou para uma imagem acessível a todos. Num domingo da Trindade, depois de uma partilha sobre as leituras, arrisca a comparar o “mistério” com “um “presunto”. E perante a assembleia interessada, seguiu: “Sim. O Pai é como se fosse o osso, o Filho como se fosse a carne (pois não é verdade que encarnou?); e o Espírito Santo como se fosse o toucinho!”. E a luz que brilhou nos olhos de todos consolou a alma do pregador até que, alguém mais inquieto perguntou: “Ó senhor prior, então e o courato?” E respondeu logo o visado: “Aí é que está o mistério!

A terceira envolve três anciãos que viviam numa ilha onde aporta um dia o bispo com a sua comitiva. Ao saber que a única oração que conheciam era esta “Tu és três; nós somos três. Tem piedade de nós!”, o bom do bispo decide ali ficar alguns dias para lhes ensinar o Pai Nosso e alguma teologia. Partindo contente pela boa evangelização, três dias depois, avista três vultos a correr sobre as águas, reconhecendo os três anciãos que convida a subir ao barco. Ao ver a tristeza que traziam pois tinham esquecido a tal oração, humilde e emocionado, o bispo consola-os dizendo: “Quando rezarem digam: Tu és Três; nós somos Três. Tem piedade de nós!

Inesperada mas urgente, é a história da poesia de Daniel Faria que descobrimos há 20 anos, na sua partida para Deus: “[…] O que sei da unidade é a túnica / Tirada à sorte. O que sei da morte e da vida / É o livro escrito por dentro e por fora / Silêncio escrito por dentro / Palavra escrita a toda a volta da história // O que sei do céu / É a mão com que sossegas os ventos // Desço à escritura como os veados aos salmos”. Desçamos nós também.

Padre Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

A Solenidade que hoje celebrámos não é um convite a decifrar a mistério que se esconde por detrás de “um Deus em três pessoas”; mas é um convite a contemplar o Deus que é amor, que é família, que é comunidade e que criou os homens para os fazer comungar nesse mistério de amor.

  • A primeira leitura sugere-nos a contemplação do Deus criador. A sua bondade e o seu amor estão inscritos e manifestam-se aos homens na beleza e na harmonia das obras criadas (Jesus Cristo é “sabedoria” de Deus e o grande revelador do amor do Pai).
  • A segunda leitura convida-nos a contemplar o Deus que nos ama e que, por isso, nos “justifica”, de forma gratuita e incondicional. É através do Filho que os dons de Deus/Pai se derramam sobre nós e nos oferecem a vida em plenitude.
  • O Evangelho convoca-nos, outra vez, para contemplar o amor do Pai, que se manifesta na doação e na entrega do Filho e que continua a acompanhar a nossa caminhada histórica através do Espírito. A meta final desta “história de amor” é a nossa inserção plena na comunhão com o Deus/amor, com o Deus/família, com o Deus/comunidade.
Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho