Nelma Morais - "Cair sete vezes, levantar oito"

15-04-2012 09:02

 

 

 

Amar-te é suicídio

 

 

Uma, duas, três, quatro, cinco, seis, sete, oito. É a oitava carta que te escrevo, mais uma daquelas que amontoarás em cima da secretária, por abrir. Chegou a minha hora bébé, vou embora. Tenho as malas feitas, o orgulho erguido em riste no meu punho cerrado e a minha cabeça levantada. Tenho os olhos cansados pelas insónias que me causaste e pelo sofrimento que me escorreu pelo rosto nestes últimos meses. Eu sabia, eu sempre soube que amar-te seria um atentado sobre aquilo que eu era, mas eu tenho uma montanha russa emocional no lugar onde devia estar o coração, e mesmo sabendo que amar-te era suicido eu segui avante, com os olhos postos nos teus traços morenos que fazem a minha paixão tonta ser mais que isso. Segui avante, como estou a seguir agora com umas poucas de lágrimas que se fixam no meu caminho. Caminho esse que agora eu vou seguir sem ti. Caminho de volta, ao sitio onde só tu vivias comigo, naquele cantinho tao docemente inebriado pelo aroma doce do teu perfume, que se entranhava nas minhas roupas. Eu estou a ir embora, deixo-te as tentativas falhadas, as fotografias, o meu amor por ti. Caí na tentação, cedi à pressão, e agora corro o risco de me tomar em arrependimento, por entre as linhas que te escrevo.  Onze tentativas, e falho a cada uma, esmorecendo sobre as folhas de papel rascunhadas e amachucadas que consomem o chão do meu quarto. Tentativas falhadas, que se assemelham ao amor que por ti nutro. Que se assemelham ás tentativas imbecis de te esquecer, de te tomar como um caso passageiro, uma paixoneta adolescente. Mas bébé, a vida é um jogo, o jogo mais injusto e nós deixamos que nos vencessem, que toda essa injustiça se julgasse rainha do amor que era nosso. Mais de quatrocentos dias, e eu não me conformo com tudo que passamos, com o que ainda íamos passar. Questiono-me se serei só eu. Só eu com esse amor estonteante que me faz perder o chão que piso quando tu me falhas.  Hoje, eu sei que foste a primeira pessoa a quem eu dirigi um ‘amo-te’ e realmente o sentia, porque meu amor, se isto não for amor eu não sei o que é. Foste a primeira que me fez cair redondamente no chão, e juro que serás a ultima também. E espero que um dia te lembres meu amor, te lembres de mim, e te arrependas de ter deixado o meu amor morrer, por meras canções adolescentes que te cantam e embalam como numa maresia de mentiras e jogos, injustos também. No fundo, todos só queremos ser amados, queremos um amor puro e belo, aquele com que todos sonhamos. Em vez de amor e confiança, recebemos um 'felizes para nunca', que ecoa na saudade que vive em vão. Ao passado, nunca iremos escapar, é por isso que eu e tu por muito que eu te ame, nunca iremos durar. Amar-te é suicido.

 

 

 

 

 

 

 

 

Tem dias que as lembranças torturam. Mais um dia cinzento, mais umas quantas aulas que demoram eternidades a passar, novamente os mesmos rostos e as mesmas vozes, as mesmas piadas sem graça, as mesmas criticas e brigas habituais, e quando prestes a desanimar por mais um dia na banalidade da vida inconscientemente estruturada por outros que levo, o sorriso dele veio pairar á minha cabeça. Eu sorri junto, o sol apareceu e fez os seus raios trespassar as densas nuvens que se acumulavam em cima da minha cabeça, os pássaros voltaram a cantar e a rotina já não me importava. Já lá vão cinco anos, desde que a criação mais perfeita, cuidadosamente desenhada por deus veio ao mundo. E sem mais demoras, estava a ouvir a voz doce dele, meio embrulhada pelo seu jeito trapalhão de querer dizer tudo de uma vez. E como que num recuo no tempo, estava de novo a ouvi-lo na primeira vez que pronunciou o meu nome, estava de novo a segurar a sua mão delicada e tão frágil nos primeiros passos. As saudades apertam, sufocam-me tanto que mal me consigo mexer, mas hoje não é assim, hoje eu sinto-o comigo. Tenho pena  de quem não conhece o sentimento que me transborda de cada vez que o vou buscar á escola e ele corre para mim, discute comigo por ter demorado e abraça-me no fim dizendo que tinha saudades. Tenho pena de quem não sabe o quanto é bom sentir o abraço tão apertado daquele pequenino, de mochila do super-homem e cabelo naturalmente desalinhado. Eu esqueço tudo nessas horas, é só eu e ele. Ele e eu, não tem mais ninguém. Eu pego-lhe na mochila e imediatamente ele dá-me a mão, e vimos o caminho todo assim, com ele a contar-me tudo o que se passou na escola naquele dia e a olhar para mim de baixo, com os olhos tão brilhantes e expressivos que falam por si. Eu reclamo com ele por não comer direito e desajeito-lhe o cabelo. Ele fica tão frustrado que tenho que lhe fazer cócegas meia hora para ele perdoar o meu ato deselegante. Não levo mais certeza nenhuma nesta vida, mas posso garantir que atravessaria o inferno todo para poder segurar a sua mão e ouvi-lo dizer que ainda há-de casar comigo, rindo que nem um bobo e fazendo-me ajoelhar para ficar do tamanho dele.  Pergunto-me como é possível amar tanto e tão intensamente outro ser humano. Eu, como menina de ciências que sou, gostaria de encontrar uma razão lógica e coerente para isto, mas não dá. Seja como for, eu amo aquele rapaz, aquele meio metro que me faz tão feliz. E que, como é obvio, consegue ser mais importante para mim do que eu mesma, porque mais uma vez comecei a falar de mim e terminarei a falar dele. É sangue, é convivência, são temperamentos iguais, chamem o que quiserem, só sei que é amor. Cheguei a casa e corri para a net, peguei no telemóvel: “ liga o pc ao gabs, diz-lhe que venha falar comigo.” E lá estava ele. Lindo, como o pai dele, a junção perfeita de tudo que eu amo. O sorriso estava lá, os dentinhos a nascer estavam lá, o cabelo desalinhado era o dele e a voz era a que sempre me acalmou. Ele chorava, pedia que o fosse buscar e eu, com a voz presa pelo choro que não deixei caír, dizia-lhe que sábado iria a correr busca-lo para estar comigo. Já lá vai muito tempo, tempo a mais. Mesmo que eu não o possa segurar todos os dias como antes, em cada noite eu peço a deus que lhe dê muita força, que faça dele um bom menino, que o proteja 24h01 por dia. E se eu puder fazer por ele o que ninguém fez por mim, eu farei. Cinco anos de orgulho, cinco anos de amor, cinco anos de cumplicidade, cinco anos de amizade, cinco anos de perfeição. Parabéns, meu príncipe.

 

 

 

 

 

 

       

" I love you more than i did before "

 

A chuva faz-se sentir lá fora e o tempo cinzento trás-lhe uma paz descomunal. Com os braços apoiados no parapeito da janela embaciada pelo contraste de temperatura, observa a lua e aquece as mãos na sua caneca de café acabado de fazer. Com pouco mais que o seu orgulho vestido, esforça-se para manter a postura. Não é suposto ela fraquejar, nem que o mundo esteja aos seus ombros. Aos poucos, enquanto o clima muda e as janelas voltam ao seu estado normal, o coração há dias desenhado com dois nomes no meio, volta a surgir. Esboça um sorriso despropositado e milhares de memórias lhe assaltam a memória. Ela precisa de lhe falar, corre para o telemóvel e marca o seu número mil vezes, até ter a certeza do que quer dizer. "Sabes..." começou ela "... eu queria ouvir-te, mas sei que será pior. Então, quando ouvires esta mensagem lembra-te que 'i love you more than i did before' , lembra-te que nada mudou e que um dia tudo será perfeito para nós, eu prometo-te. Mesmo que eu não veja o teu rostinho bonito, quero que te mantenhas firme, por mim, por nós. E olha meu amor, já foste ver a lua hoje? Está a tentar imitar o brilho do teu sorriso. Bem, não me posso alongar muito mais. Dorme bem, eu amo-te. " Desliga o telemóvel e coloca a música nos seus fones , ainda meio embaraçada meio nervosa. Nunca outrora ficara tão nervosa para dirigir umas palavras a alguém. Deita-se no sofá afim de relaxar, mas ela não comanda as dezenas de milhares de lembranças que vagueiam agora na sua mente. Decide encher a banheira e ir tomar banho, mesmo olhando as horas e sendo já tão tarde. Até que enfim é ela. Despiu o orgulho que carregava á entrada da porta, fazia agora concorrência á transparência da chuva que caía no mundo lá fora. Era estranho. Não estava feliz nem triste, só estava. O telemóvel tocou com o toque que ela tão desejava ouvir. Esticou apenas o seu braço esquerdo até o alcançar e começou a ler " Boa noite minha princesa. Tem sido difícil sem ti, mas eu entendo e espero o tempo que for preciso para concretizarmos os nossos sonhos, eu e tu. Eu permanecerei firme, por nós. Prometo-te de mindinho, pequenina. 'i love you more than i did before' " Entre os soluços do seu choro, ela sorria de forma tão pura e repetia a pequena frase, baixinho. As palavras reconfortaram-na, mas fizeram com que se sentisse fraca demais por não tomar as rédeas da situação. Olhou ao espelho e reflectiu como era fruto da ironia, um misto de desilusão com amor, fracasso com fé, esperança com medo. Voltou a vestir a sua roupa da verdade, absorta nos seus pensamentos mais íntimos e encaminhou-se até ao quarto, onde caíu de joelhos ao pé da cama. " Dá-me força para continuar a aguentar a pressão desta enorme plateia. Ajuda-me, faz-me acordar uma rapariga melhor, amanhã e sempre. Peço-te que me desculpes por todos os meus erros de hoje e que me dês um novo amanhecer amanhã, uma nova tentativa. Ei, eu sei que nunca ninguém me deu garantias que isto seria fácil, mas porquê que é assim? Ajuda-me a perceber, sózinha não consigo. Desculpa mais uma vez e obrigado por tudo, eu amo-te. " O vento faz a persiana estremecer e a chuva acalma-a. Deita a cabeça sobre a almofada e pensa que não irá chorar pois tudo ficará bem. Ela não voltará a permitir-se fraquejar, é forte agora e orgulha-se da mulher que ergueu quando a menina caíu.

 

 

 

 

Olha para cima, engole o choro e finge que não doeu. Ninguém precisa de ver, ninguém te vai entender, só vão saber cair em cima de ti com criticas e palavras cruéis, destruir os teus sonhos e fazer-te achar que vives numa mentira. As pessoas são assim, aceita. Só te tens a ti mesma, por um lado sabes que quando fraquejares e falhares três promessas das duas que fizeste, és a única que não te vai julgar nem atirar-te á cara as tuas fraquezas. Tu agora és forte, levanta a cabeça, ninguém merece ver-te nesse estado, e deixa-me dizer-te uma coisa. Eu admiro-te, por conseguires enganar tão bem toda a gente, sem exceção, quando tudo que tens são os fieis estilhaços de memórias nostálgicas espalhados por todo o lado. Quando estás cansada de estar aqui, presa por todos os teus medos infantis, por todas as fotografias amareladas e de pontas queimadas, pelo teu caderno de capa preta que não mais tem onde suportar todas as tuas lágrimas. E ficas sem saber, se foste tu que mudaste mesmo, ou se as pessoas não te conhecem como diziam, mas quem se importa com isso? No fundo todas as tuas esperanças em relação a esse amor já foram varridas pelo vento dos vendavais de emoções frequentes na tua vida, mas continuas a ir falar com aquela pequena estrela á esquerda da ursa menor, porque só com ela és sincera. Continuas a segurar o crucifixo contra o peito e acreditar com todas as tuas forças que um dia, os dias ensolarados vão voltar, e as nuvens desaparecer para bem longe. Ou pelo menos tentas. E quando acidentalmente olhas para o relógio e te deparas com horas iguais, fechas os olhos e pedes o mesmo de sempre. É psicológico, nenhum nome é dito, mas na tua mente, a sua imagem é nítida. E mesmo com milhares de motivos para deixares esse amor para trás não o fazes, porque depois de tanto mal que te fez, não há coração que resista, mas tu passas um pano quente, fechas os olhos e acreditas que amanhã será diferente. Idiotice, estupidez, infantilidade? Não, desespero, fé, esperança e boas doses de amor. Porem, ninguém sabe de tudo isto que eu falei, não é? Claro que é, era uma pergunta retorica. Ninguém nunca sabe o que vai nesse teu coração que, apesar de tudo é de manteiga, e nessa tua mente artilhada por todos os teus pensamentos mais profundos. És complexa demais para a sociedade, amas quem não deves, és diferente, nunca te hão de aceitar desta maneira. Então entende, o melhor é manteres-te fiel a ti mesma e aceitares que és a tua única companhia. 

 

 

Prometi a mim mesma não mais chorar por quem não valoriza nem ao menos o meu sorriso. Prometi também não desistir de mim, nem dos meus objetivos. Prometi dar o melhor de mim e procurar superar-me a cada dia. Todas as manhãs acordo com o propósito de ser mais feliz que o dia anterior. Às vezes consigo, porém outras vezes tudo dá errado, como se os astros não estivessem conspirando a meu favor, mas sim absolutamente contra mim. Mas não me deixo abater, nem desanimar. Não mais, não assim, não à toa. Agarro na minha esperança e fortaleço-me, faço de mim uma fortaleza para evitar que a dor me derrube. Faço de todos os obstáculos apenas mais um degrau para construir a escada que me leva á felicidade mais pura. Entrego meu coração e toda minha fé a Deus, e deixo que ele, uma vez mais me ajude a seguir, sem depender de mais ninguém. Foi demasiado tempo a deixar que outro alguém fosse o foco da minha felicidade, foram noites em claro em que deixei que a dor e a nostalgia de outros tempos invadissem meus pensamentos e assim arrasassem com toda minha vontade de sorrir. Agora é diferente, essa menina que chorava por quem não merecia, aprendeu a bloquear sentimentos, fortaleceu-se e cresceu. Agora ela avançou com sua vida, diz que está bem e derruba invejosos com um sorriso. Não mais se deixará cair nos mares do passado, não de novo.

 

 

 

 

Não foi por falta de luta, não foi por falta de vontade, muito menos por falta de amor. Não foi falta de coragem de enfrentar os julgamentos de toda a plateia das nossas vidas, que não tiram os olhos de cima de nós por um momento. Não foi falta de paciência, porque paciência é uma das escassas virtudes que eu possuo. Mas sabes, na verdade também não foi culpa tua, não foi culpa minha. Acho que simplesmente não estava escrito, não fomos seres concebidos para quando em junção dar certo. Talvez um dia, já cada um de nós em suas vidas, hipoteticamente construídas, nos voltemos a encontrar e nossos olhares voltem a cruzar-se em sintonia, e o bater sincronizado dos nossos corações forme uma perfeita sinfonia. Talvez, quem sabe, um dia mais tarde, com mais uns anos de maturidade e experiencia em cima de nós, nos voltemos a encontrar e fazer as coisas resultar de um jeito imperfeitamente perfeito. Não descarto esse fim, para aquela história que em tempos não foi minha nem tua, foi nossa. E se isso um dia realmente acontecer, com quase toda a certeza digo que te irei receber com um abraço, e terei todo o gosto de dizer que realmente me pertencias. Talvez um dia, volte a inebriar-me pelo aroma doce do teu perfume, volte a perder-me na imensidão de intensidade desse teu olhar cor de amêndoa, volte a sentir o coração com batidas descompassadas, pela tua presença. Mas até lá, até esse dia, temos muito que crescer. Temos muito por onde aprender a ser melhor, mais corretos. Não digo perfeitos, mas em medidas acertadas um para o outro. E eu, por enquanto, vou continuar a dizer que te odeio, para quando esse dia chegar, eu possa para sempre dizer que te amo, com toda a certeza.

 

 

 

 

Não vale de todo a pena falar sobre mim, sobre as minhas qualidades e defeitos, sobre a minha maneira de ser, porque cada um me vê de maneira diferente. Para muitos não passo de uma criança, sem maturidade e sem ‘experiência de vida’ . Outros,  veem em mim alguém com quem podem contar, independentemente do que for. Enfim, é e sempre será assim. A minha educação depende da dos outros, bem como a minha grosseria, o meu bom humor depende de como me estiver a correr o dia, e a minha simpatia? Isso depende de pouca coisa. Não importa a cor, o nível social, os modos como se veste, o que faz e usa. Se for simpático comigo, eu serei simpática de volta. Posso dizer que amo as coisas simples da vida. Sou apaixonada por sorrisos e por olhares que falem. Odeio a sociedade em que me encontro inserida. Não sou de relacionamento fácil, e tenho consciência disso, mas pelo menos sei que não ando a fingir sentimentos por ninguém. Mudei bastante desde o ano passado, creio que me apercebi que isto aqui não é wonderland, e eu? Bem, eu não sou a Alice. Enfim, Nelma Morais , prazer.