IV Domingo de Páscoa - Ano A

11-05-2014 08:15

 

"… caminha à sua frente e as ovelhas seguem-no, porque conhecem a sua voz.”.

Jo 10, 4

 

A voz humana é das características mais espantosas que temos. Dizem os entendidos que começamos a reconhecer as vozes dos pais ainda na barriga da nossa mãe. E do choro inicial ao balbuciar dos primeiros tempos, das primeiras palavras às últimas, do gritar ao cantar, é espantosa a comunicação que produzimos. Várias vezes me recordo do filme “Nell”, com Jodie Foster e Liam Neesson, em que uma jovem, encontrada em estado selvagem, aprende a dizer e a dizer(-se) num processo de comunicação e relação que revela a importância de “encontrarmos a nossa voz”. Na Bíblia fala-se de Jesus como o Verbo, e Jesus realiza milagres com a força da palavra.

Mas, ultimamente, falarmos da “voz” é pensar quase imediatamente em alguns “reality shows” televisivos, em que os concorrentes estão expostos constantemente (qual peixes de um aquário!), e têm de cumprir as tarefas mais inverossímeis sob o comando de uma voz que manda, julga, avalia, recompensa e condena (qual voz de um deus desconhecido, último garante das audiências televisivas). É talvez uma parábola do mundo contemporâneo em que, substituindo o silêncio pelo ruído constante (música, rádio e televisão sempre ligados) é possível perguntar: a voz interior, o reflectir sobre o que vejo, o pensar sobre mim e o mundo, a consciência, tornaram-se tão incómodos que o melhor é enterrá-los de vez? Mas, assim como temos voz para comunicar(mo-nos), quais as vozes que escutamos e nos ajudam (ou não) a crescer? 

A voz é um meio cheio de conteúdo. Comunica uma mensagem, e o modo de a comunicar revela tanto ou mais do que o conteúdo. Gosto tanto de imaginar como seria a voz de Jesus! Não só esta que penso “ouvir” no meu pensamento e no coração. Mas aquela que os discípulos e as multidões ouviram, que fez a samaritana colocar as suas questões e Maria Madalena reconhecê-l’O ressuscitado. A sua voz a dizer as bem-aventuranças e a contar as parábolas, a pedir a Zaqueu para ficar em sua casa e a perguntar a Pedro se O amava. Essa voz não se perdeu e acredito que continua a ouvir-se em tantas palavras da Igreja, e nas vozes dos que O escutam e seguem. Mas, às vezes, pergunto-me se não deixamos de O escutar. Porque as nossas vozes não abraçam nem acolhem, não salvam nem abrem futuros de esperança. Parecem “discos riscados”.

Conhecer e crescer em intimidade com Jesus é o que o Pai deseja para todos nós. Por isso, a escuta é fundamental; a alegria de ouvirmos o nosso nome na sua boca é revitalizador; descobrir que Ele fala na voz de outros e na nossa também, é convite à comunhão. Criar espaços e condições para essa escuta e diálogo mútuos, entre nós e com Jesus, chama-se evangelização. Mas se andarmos de auscultadores sempre postos, ou a seguir vozes que não nos deixam pensar por nós próprios, bem pode Jesus chamar-nos que dificilmente O ouviremos. É verdade, vocação quer dizer chamamento! Sentimo-nos chamados? Por quem? Para quê?

Pe. Vitor Gonçalves

Voz da Verdade

 

 

O 4º Domingo da Páscoa é considerado o “Domingo do Bom Pastor”, pois todos os anos a liturgia propõe, neste domingo, um trecho do capítulo 10 do Evangelho segundo João, no qual Jesus é apresentado como “Bom Pastor”. É, portanto, este o tema central que a Palavra de Deus põe hoje à nossa reflexão.

  • O Evangelho apresenta Cristo como “o Pastor”, cuja missão é libertar o rebanho de Deus do domínio da escravidão e levá-lo ao encontro das pastagens verdejantes onde há vida em plenitude (ao contrário dos falsos pastores, cujo objectivo é só aproveitar-se do rebanho em benefício próprio). Jesus vai cumprir com amor essa missão, no respeito absoluto pela identidade, individualidade e liberdade das ovelhas.
  • A segunda leitura apresenta-nos também Cristo como “o Pastor” que guarda e conduz as suas ovelhas. O catequista que escreve este texto insiste, sobretudo, em que os crentes devem seguir esse “Pastor”. No contexto concreto em que a leitura nos coloca, seguir “o Pastor” é responder à injustiça com o amor, ao mal com o bem.
  • A primeira leitura traça, de forma bastante completa, o percurso que Cristo, “o Pastor”, desafia os homens a percorrer: é preciso converter-se (isto é, deixar os esquemas de escravidão), ser baptizado (isto é, aderir a Jesus e segui-l’O) e receber o Espírito Santo (acolher no coração a vida de Deus e deixar-se recriar, vivificar e transformar por ela).

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