33º Domingo do Tempo Comum - Ano C

13-11-2016 09:25

 

  

“Pela vossa perseverança salvareis as vossas almas.” Lc 21, 19

 

 

O que fica do que passa” é uma expressão de que gosto muito e, afinal, não tão extraordinária como pensava. Bastou uma rápida pesquisa no Google para descobri-la em muitos textos, título de crónicas e várias reflexões, e até de um espectáculo. Pronto lá se perdeu o efeito “surpresa”, mas continuo a gostar dela! Como a peneira do pesquisador de ouro que o ajuda a retirar pequenas pepitas da corrente arenosa de algum rio, assim é o acto de pensar sobre o importante e o essencial, por entre a corrida da vida. Como num velho conto sobre dois amigos, em que um escrevia na areia as ofensas, mas gravava em pedra os gestos de verdadeira amizade do outro!

Devia ser admirável a beleza do Templo de Jerusalém ao tempo de Jesus. Só faltavam lá os turistas a fotografar cada pormenor e a tirar “selfies” para pôr no “Facebook”! Jesus lançou um balde de água fria sobre os piedosos comentários, relativizando a beleza e aparente solidez daquelas pedras com uma frase: “tudo será destruído”! Não foi profeta da desgraça, mas advertia para o essencial: tudo passa, tudo se transforma, só Deus permanece, e a vida com Ele que se chama amor. Assim as perseguições serão ocasião de dar testemunho, as perdas ocasião para valorizar o essencial, os “anéis” que se vão, como diz o provérbio, oportunidade para redescobrir os dedos. Não se trata de consolo barato nem elogio do sofrimento, pois a grande promessa de Jesus é a sua presença nas palavras e na sabedoria, para enfrentar juízes e perseguidores, e até faz uma promessa bem estranha: “nenhum cabelo da vossa cabeça se perderá”! A virtude da perseverança evoca a permanência no essencial, a coragem de escolher o que é mais importante, e dar a vida por isso.

Todo o fim pressupõe uma espera. De alegria antecipada, de medo, de compromisso ou de demissão, muitas podem ser as atitudes de quem espera. S. Paulo aos Tessalonicenses indica que a espera do Senhor se faz trabalhando. É trabalho pelo alimento e pela construção do mundo, levando ao máximo as capacidades e dons de todos. Pobres de nós quando nos limitamos ou limitamos outros nas extraordinárias possibilidades de fazer mais e melhor. Como fazemos de cada dia uma pequena pérola ou pedra preciosa por onde passa o fio invisível do amor? É preciso não temer o fim nem nos demitirmos da esperança, mas aprender a relativizar tudo aquilo que é para passar. No meio do turbilhão de conflitos e guerras, de injustiças e perseguições, a pequena luz do amor de Deus não deixará de brilhar. “Pequenina luz” como diz Jorge de Sena num belíssimo poema: “[...] Tudo é incerto ou falso ou violento: brilha. / Tudo é terror vaidade orgulho teimosia: brilha. / Tudo é pensamento realidade sensação saber: brilha. / Tudo é treva ou claridade contra a mesma treva: brilha. / Desde sempre ou desde nunca para sempre ou não: / brilha. / Uma pequenina luz bruxuleante e muda / como a exactidão como a firmeza / como a justiça. / Apenas como elas. / Mas brilha. / Não na distância. Aqui/ no meio de nós. / Brilha.” A luz que é Deus connosco, o que fica do que passa!

Padre Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 
 
 
A liturgia deste domingo reflecte sobre o sentido da história da salvação e diz-nos que a meta final para onde Deus nos conduz é o novo céu e a nova terra da felicidade plena, da vida definitiva. Este quadro (que deve ser o horizonte que os nossos olhos contemplam em cada dia da nossa caminhada neste mundo) faz nascer em nós a esperança; e da esperança brota a coragem para enfrentar a adversidade e para lutar pelo advento do Reino.
  • Na primeira leitura, um “mensageiro de Deus” anuncia a uma comunidade desanimada, céptica e apática que Jahwéh não abandonou o seu Povo. O Deus libertador vai intervir no mundo, vai derrotar o que oprime e rouba a vida e vai fazer com que nasça esse “sol da justiça” que traz a salvação.
  • O Evangelho oferece-nos uma reflexão sobre o percurso que a Igreja é chamada a percorrer, até à segunda vinda de Jesus. A missão dos discípulos em caminhada na história é comprometer-se na transformação do mundo, de forma a que a velha realidade desapareça e nasça o Reino. Esse “caminho” será percorrido no meio de dificuldades e perseguições; mas os discípulos terão sempre a ajuda e a força de Deus.
  • A segunda leitura reforça a ideia de que, enquanto esperamos a vida definitiva, não temos o direito de nos instalarmos na preguiça e no comodismo, alheando-nos das grandes questões do mundo e evitando dar o nosso contributo na construção do Reino.
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