32º Domingo do Tempo Comum - Ano C

06-11-2016 09:16

 

“Não é um Deus de mortos, mas de vivos, porque para Ele todos estão vivos.” Lc 20, 38 

 

 

As representações de céus e de infernos sempre inspiraram artistas e visionários. Há um desejo visceral de abrir uma janela sobre “o mais além”, nem que seja para estimular ou ameaçar os que vivemos “mais aquém”. Não esqueço o que se dizia de certo pregador que, para que as pessoas se convertessem nem que fosse pelo medo, descrevia detalhadamente o inferno e os seus tormentos, como se lá tivesse estado 15 dias! Custa assumir a nossa ignorância e dizer que não sabemos como é, e simplesmente confiar nas palavras de Jesus de “vivermos eternamente”, como a “grande surpresa” do amor de Deus!

A situação com que pretendem os saduceus, descrentes da ressurreição, atacar Jesus, parte do grande erro de considerar a ressurreição como um prolongamento desta vida. À vida não prolongada pela descendência dos sete homens e da mulher, Jesus contrapõe a vida de filhos de Deus, novidade “já aqui” e que será plena na “vida futura”. É a tal “grande surpresa” de que falava há pouco, que também não cabe nos critérios estreitos de domínio, poder, vidinha arrumada e confortável, religião acumuladora de méritos,   

Quem me conhece sabe o quanto gosto dos desenhos e textos de um padre espanhol chamado José Luís Cortés, e das obras em que procurou desenhar o evangelho e os temas da fé e da igreja no mundo com graça e com a Graça. Tenho pena de não poder colocar aqui uma página relativa a este evangelho mas ouso traduzir o seu comentário: “Não entendemos nada. O Evangelho esgana-se gritando-nos que a verdadeira transcendência de Deus não é para cima, mas para dentro. Que o amor é o sacramento que torna presente Deus e o resto são truques de feira; que contactamos com Deus quando perdoamos e não quando ficamos de olhos brancos; que não há nada mais “religioso” do que a justiça: com os órfãos, as viúvas, os desempregados, os imigrantes...; que o balão teológico desincha quando se tem de viver com o ordenado mínimo; que o chamado “sagrado” ou litúrgico” pode parecer teatro ou bruxaria; que ninguém nos vai condenar pelo que deixámos de rezar mas pelo que deixámos de fazer. Deus não está “mais além” [...] Porque o nosso Deus não é um Deus de mortos (de coisas mortas) mas um Deus de vivos (de gente viva).

A vida nova de que Jesus fala já começou em cada um de nós. No fundo é acolher e promover as “pequenas surpresas” desta vida, que só pede para a vivermos intensamente. Colaborando para que haja mais vida ao nosso redor. Buscando Deus em tudo o que é vida, e em todas as coisas que nos “sabem” aos Deus Vivo (incluindo muitos prazeres, que só fazem mal se nos escravizam ou os vivemos sozinhos!). Basta de “vidinhas” amedrontadas ou em constante luto pelo que se perdeu, vidas onde falta sol e mar e nunca se ouve música, vidas cheias de pó ou bafientas de naftalina. Como preparamos “a grande surpresa” do encontro face a face com Deus, se desprezamos estas pequenas que recebemos e podemos dar?

Pe. Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

 

A liturgia deste domingo propõe-nos uma reflexão sobre os horizontes últimos do homem e garante-nos a vida que não acaba.

  • Na primeira leitura, temos o testemunho de sete irmãos que deram a vida pela sua fé, durante a perseguição movida contra os judeus por Antíoco IV Epifanes. Aquilo que motivou os sete irmãos mártires, que lhes deu força para enfrentar a tortura e a morte foi, precisamente, a certeza de que Deus reserva a vida eterna àqueles que, neste mundo, percorrem, com fidelidade, os seus caminhos.
  • No Evangelho, Jesus garante que a ressurreição é a realidade que nos espera. No entanto, não vale a pena estar a julgar e a imaginar essa realidade à luz das categorias que marcam a nossa existência finita e limitada neste mundo; a nossa existência de ressuscitados será uma existência plena, total, nova. A forma como isso acontecerá é um mistério; mas a ressurreição é uma certeza absoluta no horizonte do crente.
  • Na segunda leitura temos um convite a manter o diálogo e a comunhão com Deus, enquanto esperamos que chegue a segunda vinda de Cristo e a vida nova que Deus nos reserva. Só com a oração será possível mantermo-nos fiéis ao Evangelho e ter a coragem de anunciar a todos os homens a Boa Nova da salvação.
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