32º Domingo do Tempo Comum - Ano C

10-11-2013 08:43

 

" Não é um Deus de mortos, mas de vivos, porque para Ele todos estão vivos.”

Lc 20, 38

 

É intrincada e malévola a questão colocada a Jesus pelos saduceus sobre a ressurreição. 

Para além da resistência espantosa daquela mulher que casou com os sete irmãos, claramente

se demonstra a ignorância de quem pretende imaginar uma vida eterna à imagem desta

que conhecemos. É aí que a fé se entende também como confiança: a surpresa faz parte

da relação espantosa em que Deus nos faz entrar. Pobre mulher (a da comparação atrás)

se tivesse que “aturar” os sete maridos ao mesmo tempo!   

A crise de esperança que caracteriza o nosso tempo é real e profunda. E afecta também

o horizonte de um futuro para além da morte. É fácil cair-se no imediato e no vazio que

as pequenas esperanças não conseguem encher. Curiosamente, nos encontros rápidos

da nossa agitação, à pergunta: “como vais?”, há uma resposta quase imediata:

vou (ou vamos) andando”! E ainda que nem sempre a formule, penso logo noutra

pergunta: “E vaispara onde”? O psiquiatra José Gameiro, na coluna de opinião da

Revista do Jornal Expresso assina uma deliciosa crónica com o título desta rotineira

resposta. E aí escreve: “Desde muito cedo que aprendemos a dissimular o que sentimos,

o que achamos, o que pensamos. O que nos vai cá dentro, ninguém nos pode tirar,

mas não é muito popular sermos francos e directos. […] Vou andando ao sabor da vida,

nunca me perguntando como posso influenciar o que me vai acontecendo. Prefiro sofrer,

queixar-me dizer ‘eles é que sabem tudo e fazem o que querem’…Eu não tenho culpa

de nada disto, trabalho, vou para casa todos os dias, só discuto futebol, que o resto

já não vale a pena…”.

Já pensámos que cada um de nós, pelas escolhas que assume, vai também construindo

o futuro? Que as mudanças mais importantes começam dentro de cada um de nós? E que,

no fundo, a verdadeira transcendência não tem tanto a ver com “o mais acima”, ou

“o mais além”, mas “o mais dentro” das pessoas e da vida? Podemos ter mil e uma ideias

de como Deus é; Jesus insiste: “é um Deus de vivos”! Com todas as consequências que

isso implica de responsabilidade e surpresa!

Quem desce a Almirante Reis e a Rua da Palma, ao entrar na Praça Martim Moniz,

é saudado por um enorme galo colorido, feito de materiais reciclados, escultura de

Rui Miragaia, curiosamente intitulado “Ressurreição”. O lixo transformado e o cantar

do galo que anuncia o novo dia são dois pequenos sinais de que ressuscitar é também

uma escolha que fazemos!  

Acreditar na ressurreição (e sobretudo em Jesus ressuscitado) é comprometer-se,

ainda mais, com esta vida. A que brota das mãos e das palavras, do amor e da justiça,

apesar das nossas imperfeições. Porque Deus é um Deus de vivos. O que é que,

à nossa volta, nos sabe ao Deus vivo? Que imagens e práticas precisamos purificar

para viver mais intensamente e para que haja mais vida à nossa volta? O que nos pode

despertar para sermos mais autênticos?

 

P. Vitor Gonçalves

in "Voz da Verdade"

A liturgia deste domingo propõe-nos uma reflexão sobre os horizontes últimos do homem e garante-nos a vida que não acaba.
  • Na primeira leitura, temos o testemunho de sete irmãos que deram a vida pela sua fé, durante a perseguição movida contra os judeus por Antíoco IV Epifanes. Aquilo que motivou os sete irmãos mártires, que lhes deu força para enfrentar a tortura e a morte foi, precisamente, a certeza de que Deus reserva a vida eterna àqueles que, neste mundo, percorrem, com fidelidade, os seus caminhos.
  • No Evangelho, Jesus garante que a ressurreição é a realidade que nos espera. No entanto, não vale a pena estar a julgar e a imaginar essa realidade à luz das categorias que marcam a nossa existência finita e limitada neste mundo; a nossa existência de ressuscitados será uma existência plena, total, nova. A forma como isso acontecerá é um mistério; mas a ressurreição é uma certeza absoluta no horizonte do crente.
  • Na segunda leitura temos um convite a manter o diálogo e a comunhão com Deus, enquanto esperamos que chegue a segunda vinda de Cristo e a vida nova que Deus nos reserva. Só com a oração será possível mantermo-nos fiéis ao Evangelho e ter a coragem de anunciar a todos os homens a Boa Nova da salvação.

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