23º Domingo do Tempo Comum - Ano B

04-09-2015 16:48

 

"Tudo o que faz é admirável:f az que os surdos oiçam e que os mudos falem.” Mc 7, 37

 

Habituados a antecipar o verão, os jacarandás lisboetas costumam florescer em maio e oferecer-nos as suas flores perfumadas de um azul ou roxo intenso nesses primeiros tempos de calor. Mas, de vez em quando, encontram-se alguns, que não ligando aos calendários desatam a florescer noutras alturas, como estes que, aqui no Rossio de Lisboa, decidiram saudar setembro. Gosto desta liberdade floral e da ousadia em surprender que os jacarandás testemunham. E comparo-os à abundância de frutos (que tristemente ninguém vai apanhar!) que árvores e arbustos frutíferos oferecem por onde quer que estejam plantadas! Podia haver uma lei a punir os donos que deixam estragar o que a natureza dá, e, já agora, a advertir quem passa indiferente à beleza dos jacarandás!

 Do “aqui” das últimas palavras que partilhei convosco desde a Terra Santa, chego a vós com o “agora” que os jacarandás e a cura que Jesus faz no evangelho me inspiraram. De facto, temos uma enorme dificuldade em viver no “agora”! Gastamos mais tempo e energia com o que já foi e com o que ainda não veio, que mal damos pelo presente. E às mil e uma oportunidades de moldar o presente oferecemos desculpas como numa canção dos “Deolinda”: “ – Agora não, que falta um impresso…/ – Agora não, que o meu pai não quer…/ – Agora não, que há engarrafamentos…/ Vão sem mim que eu vou lá ter.” Muitos “agora é que vai ser!” iremos ouvir nas campanhas eleitorais que se aproximam, e é fundamental não se ficar nas promessas de um futuro ilusório nem nas acusações de um passado já gasto, para que a responsabilidade e o compromisso nos envolvam a todos.

Em contexto bíblico a surdez era uma doença terrível. Num povo que privilegiava a palavra, com quem Deus falava como amigo, e que promovia o diálogo, não conseguir escutar e ter a lingua presa era uma condenação irremediável. Claro que os profetas vão pondo a nú a surdez do povo que se fecha e resiste aos apelos de Deus. Muito mais grave do que uma imperfeição física, ela pode significar uma insensibilidade à justiça e ao amor que Deus sempre convida a viver. Torna-se uma espécie de autismo, que aprisiona numa “autosuficiência” de ideias e transforma o discurso numa “cassete” repetitiva. E isto não tem a ver só com a religião!

Jesus não gasta tempo em explicações; diante do surdo que mal podia falar trazido por alguns amigos realiza uma “ética da cura” que restaura o outro da sua integridade. É no “agora” da necessidade humana que é preciso fazer alguma coisa. E Marcos fala-nos de um processo: o recolhimento e o encontro pessoal com Jesus sublinham a intimidade onde pode germinar a fé; os gestos nos ouvidos e na boca lembram a criação do homem; o suspiro e a palavra “Abre-te!” afirmam que, fechados a Deus estamos como mortos! Ser humano é deixarmo-nos tocar: pelo outro e por Deus. Quem sabe, talvez também por uns jacarandás floridos! E isso acontece “agora”!

Pe. Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

 

A liturgia do 23º Domingo do Tempo Comum fala-nos de um Deus comprometido com a vida e a felicidade do homem, continuamente apostado em renovar, em transformar, em recriar o homem, de modo a fazê-lo atingir a vida plena do Homem Novo.

  • Na primeira leitura, um profeta da época do exílio na Babilónia garante aos exilados, afogados na dor e no desespero, que Jahwéh está prestes a vir ao encontro do seu Povo para o libertar e para o conduzir à sua terra. Nas imagens dos cegos que voltam a contemplar a luz, dos surdos que voltam a ouvir, dos coxos que saltarão como veados e dos mudos a cantar com alegria, o profeta representa essa vida nova, excessiva, abundante, transformadora, que Deus vai oferecer a Judá.
  • No Evangelho, Jesus, cumprindo o mandato que o Pai Lhe confiou, abre os ouvidos e solta a língua de um surdo-mudo… No gesto de Jesus, revela-se esse Deus que não Se conforma quando o homem se fecha no egoísmo e na auto-suficiência, rejeitando o amor, a partilha, a comunhão. O encontro com Cristo leva o homem a sair do seu isolamento e a estabelecer laços familiares com Deus e com todos os irmãos, sem excepção.
  • A segunda leitura dirige-se àqueles que acolheram a proposta de Jesus e se comprometeram a segui-l’O no caminho do amor, da partilha, da doação. Convida-os a não discriminar ou marginalizar qualquer irmão e a acolher com especial bondade os pequenos e os pobres.

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