15º Domingo do Tempo Comum - Ano C

10-07-2016 08:58

 

 

“Quem é o meu próximo?” Lc 10, 29

 

 

Aprendi, nestes dias, com Dory e com Hank o que é a falta de memória de curto prazo e o que se perde por demasiada planificação. Antes de mais, Dory, uma pequena “peixe cirurgião-paleta”, e Hank, um ágil e surpreendente polvo, são dois dos personagens da mais recente animação da Disney/Pixar, intitulada “À procura de Dory”. Nela reencontramos o pequeno Nemo e Merlim, seu pai, “peixes-palhaço” que nos tinham enternecido no filme “À procura de Nemo”, em novas aventuras. E não resisto em partilhar convosco não só a beleza visual, mas toda a qualidade narrativa deste filme. Até na leitura da parábola do Bom samaritano me guiaram.

Dory esquece-se facilmente de tudo. Já assim era no primeiro filme, mas quando se decide a procurar os seus pais e as suas origens, só com a ajuda de ténues lembranças, nada a pode demover. Excepto, esquecer-se que os procura! Bem esquecidos do coração da Lei estavam o sacerdote e o levita quando passaram ao lado do homem meio-morto, no caminho de Jerusalém para Jericó. Tinham esquecido a compaixão e a misericórdia com os mais fracos, com os doentes. Tiveram, porventura, receio de ficarem impuros ao tocar em alguém ferido ou, quem sabe, morto. Vinham ou iam para a liturgia do Templo? Dirá mais tarde o Talmude: “Se o sumo sacerdote, quando se dirige para o Templo para celebrar o Yôm Kippûr, se vem a deparar com um cadáver, não deve hesitar em ‘tornar-se impuro’ no contacto com o cadáver, porque a ‘misericórdia da verdade’ prevalece sobre a liturgia do Yôm Kippûr.” Faltou-lhes a “misericórdia da verdade”, aquela que não busca retribuição, que sabe ver quem precisa mesmo que não esteja caído no caminho de Jerusalém a Jericó, mas habita connosco, vive no mesmo prédio, trabalha ao nosso lado. Esquecer e passar indiferente é distanciarmo-nos de Deus!

Hank tem um plano. Tudo faz para o alcançar e mesmo a ajuda oferecida a Dory é em função dele. Perante a hipótese de uma vida livre e sem medos, Dory mostra-lhe como a sua vida cheia de surpresas e imprevistos, de soluções que tem de procurar em cada momento, lhe deu a conhecer o melhor. O sacerdote, o levita e o samaritano tinham planos de viagem. Apenas o samaritano adiou o seu, e abraçou o inesperado plano de cuidar daquele desfavorecido, tão bem expresso em vários verbos: “ver”, “encher-se de compaixão”, “ligar”, “deitar”, “colocar”, “levar” e “cuidar”. É o amor em acção, sem outro interesse que o de socorrer, independentemente da sua condição social ou cultural. Quanto excesso de planificação adormece o encanto em responder aos pequenos-grandes apelos de Deus? Quantos projectos de grandeza e ostentação, de busca de poder e de prestígio, têm atrofiado o nosso testemunho de cristãos e de Igreja? Para o maior bem daquele homem, o samaritano soube também contar com ajuda do estalajadeiro, alargou a outros a possibilidade de fazer o bem. Somos capazes de vislumbrar o plano de Deus para lá da muralha dos nossos planos?

Dory e os seus amigos oferecem-nos outras pequenas lições de vida. Não esquecer o importante, e não colocar nenhum plano à frente da possibilidade de ser próximo podem ser dois deles. Outros podem ser descobertos. Se tivermos o gosto da procura!

Padre Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

A liturgia deste domingo procura definir o caminho para encontrar a vida eterna. É no amor a Deus e aos outros – dizem os textos que nos são propostos – que encontramos a vida em plenitude.

  • O Evangelho sugere que essa vida plena não está no cumprimento de determinados ritos, mas no amor (a Deus e aos irmãos). Como exemplo, apresenta-se a figura de um samaritano – um herege, um infiel, segundo os padrões judaicos, mas que é capaz de deixar tudo para estender a mão a um irmão caído na berma da estrada. “Vai e faz o mesmo” – diz Jesus a cada um dos que o querem seguir no caminho da vida plena.
  • A primeira leitura reflecte, sobretudo, sobre a questão do amor a Deus. Convida os crentes a fazer de Deus o centro da sua vida e a amá-lo de todo o coração. Como? Escutando a sua voz no íntimo do coração e percorrendo o caminho dos seus mandamentos.
  • Na segunda leitura, Paulo apresenta-nos um hino que propõe Cristo como a referência fundamental, como o centro à volta do qual se constrói a história e a vida de cada crente. O texto foge, um tanto, à temática geral das outras duas leituras; no entanto, a catequese sobre a centralidade de Cristo leva-nos a pensar na importância do que Ele nos diz no Evangelho de hoje. Se Cristo é o centro a partir do qual tudo se constrói, convém escutá-l’O atentamente e fazer do amor a Deus e aos outros uma exigência fundamental da nossa caminhada.

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