1º Domingo da Quaresma - Ano A

01-03-2020 08:56

 

 

 

“Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto, a fim de ser tentado pelo Diabo.” Mt 4, 1

 

 Quase ao terminar o filme “O advogado do diabo”, de Taylor Hackford, o personagem diabólico, magnificamente interpretado por Al Pacino, diz, de frente para a câmara: “A vaidade é o meu pecado preferido!” E frequentemente me lembro destas palavras e do olhar do actor quando leio o relato das tentações de Jesus no deserto, tão nossas e tão minhas! Nelas se podem resumir as tentações essenciais da nossa relação com Deus, mas também com os outros e com o mundo, na medida em que posso colocar-me no centro de tudo. Vencê-las, imitando Jesus, pode, ainda assim, produzir a tentação duma “pontinha de vaidade” capaz de recolocar o “herói” de tais batalhas no próprio centro que tinha recusado!

A tentação de “sermos deuses” por nós próprios percorre a história humana. Do paraíso aos homens e imperadores que quiseram ser adorados, encontramos sempre as mesmas consequências: afastamento da humanidade, prepotência e violência sobre os outros, solidão absoluta. Pelo poder das armas, do dinheiro, da fama, não aceitam a vida dos homens seus irmãos. Tentam fazer de Deus um instrumento ao seu serviço, para alterar a condição humana em proveito próprio, recusando a tarefa comum do homem na construção do mundo.

Jesus fez-se semelhante a nós também nas tentações. E enfrentou-as verdadeiramente identificado com a nossa condição humana. Como Filho de Deus nada eliminou da sua humanidade. As suas respostas estão ao nosso alcance, pela confiança em Deus e atenção constante à sua palavra. É com as Escrituras que Jesus rejeita o projecto aliciante mas escravizador do Diabo. Do deserto, após um longo jejum, onde a fragilidade mais se manifesta, a um monte alto, onde os olhos se inebriam com o domínio do horizonte, Jesus recusa quebrar a relação amorosa com o Pai. É no amor a Deus que podemos encontrar a mesma força das respostas de Jesus. Mais essencial que os bens e a volúpia do ter, amá-l’O com todo o coração; maior do que usar Deus em proveito próprio, amá-l’O com toda alma; melhor do que o poder de muitos reinos, amá-l’O com todas as forças. E só assim podemos derrotar o Diabo: recusando ser centro, e ter no centro de nós, Aquele que nos ama e nunca escraviza. 

De muitas formas se manifestam estas tentações no decorrer da vida humana. Pequenas e grandes, novas e conhecidas, exigem vigilância e fidelidade, esperança e misericórdia. Relembram-nos que ser filho de Deus não é “seguro contra todos os riscos”. Que estamos mais próximos de todos e mais humanos. Que a responsabilidade do amor de Deus vale mais do que todas as “prisões doiradas” ou “altares etéreos”, vendidos por quem os parece oferecer!

Padre Vitor Gonçalves

in Voz da Verdade

 

No início da nossa caminhada quaresmal, a Palavra de Deus convida-nos à "conversão" - isto é, a recolocar Deus no centro da nossa existência, a aceitar a comunhão com Ele, a escutar as suas propostas, a concretizar no mundo - com fidelidade - os seus projectos.

  • A primeira leitura afirma que Deus criou o homem para a felicidade e para a vida plena. Quando escutamos as propostas de Deus, conhecemos a vida e a felicidade; mas, sempre que prescindimos de Deus e nos fechamos em nós próprios, inventamos esquemas de egoísmo, de orgulho e de prepotência e construímos caminhos de sofrimento e de morte.
  • A segunda leitura propõe-nos dois exemplos: Adão e Jesus. Adão representa o homem que escolhe ignorar as propostas de Deus e decidir, por si só, os caminhos da salvação e da vida plena; Jesus é o homem que escolhe viver na obediência às propostas de Deus e que vive na obediência aos projectos do Pai. O esquema de Adão gera egoísmo, sofrimento e morte; o esquema de Jesus gera vida plena e definitiva.
  • O Evangelho apresenta, de forma mais clara, o exemplo de Jesus. Ele recusou - de forma absoluta - uma vida vivida à margem de Deus e dos seus projectos. A Palavra de Deus garante que, na perspectiva cristã, uma vida que ignora os projectos do Pai e aposta em esquemas de realização pessoal é uma vida perdida e sem sentido; e que toda a tentação de ignorar Deus e as suas propostas é uma tentação diabólica e que o cristão deve, firmemente, rejeitar.

Grupo Dinamizador:
P. Joaquim Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)